Publicado originalmente no site do Portal Infonet, em 14 de abril de 2019
O crime mais rumoroso de Aracaju
Por Marcos Cardoso (Blog Infonet)
O Brasil é um dos países mais violentos e Sergipe não escapa
da epidemia de homicídios que aterroriza a todos. A outrora pacata Aracaju é
hoje até citada como uma das cidades mais violentas do mundo, o que é
contestado pelas autoridades.
Mas no passado aconteceram crimes que marcaram a história da
cidade. O caso mais famoso foi o assassinato do médico e político Carlos Firpo,
que ficou conhecido como o Crime da Rua Campos. Já há mais de 50 anos, no dia
25 de maio de 1958, o médico foi morto a facada enquanto dormia, no quarto de
sua casa. O crime jamais foi inteiramente esclarecido.
“O impacto que provocou na sociedade foi superestimado
sensacionalmente pela imprensa escrita e falada em proporções jamais vistas em
Sergipe”, recorda o historiador Ibarê Dantas (“Os Partidos Políticos em
Sergipe: 1889-1964”).
“Embora hoje se acredite que o homicídio foi motivado por
razões passionais, as explorações desenvolvidas em torno do caso em pleno ano
eleitoral foram de tal ordem que nunca ficou inteiramente esclarecido,
permanecendo como um exemplo daqueles tempos tumultuados do primeiro governo
udenista” de Leandro Maynard Maciel.
Vinculado à UDN, diretor do Hospital Santa Isabel, Carlos
Firpo era apontado como provável companheiro de chapa de Heribaldo Dantas
Vieira, que pleiteava candidatar-se ao governo do Estado. Seu desejo de
candidatar-se contrariava interesses do seu partido.
Insinuou-se na época que o também prestigioso médico e então
vice-governador José Machado de Souza teria relação com o assassinato,
informação que foi prontamente rechaçada pelas demais autoridades estaduais,
que chagaram a fazer uma manifestação de solidariedade e desagravo na porta de
sua casa, na rua Pacatuba. Dr. Machado era amigo de Carlos Firpo.
Pires Wynne (“História de Sergipe: 1930-1972”) cita o caso
de forma parcial, com o intuito de fazer a defesa do vice-governador, e
transcreve um capítulo do livro Sergipe por um Óculo, do general José Lopes
Bragança, que tampouco é imparcial e tenta tão-somente provar a inocência da
viúva, Milena, e do então coronel da Aeronáutica Afonso Ferreira Lima.
Ela é filha do imigrante italiano Nicola Mandarino, sobre
quem, pouco mais de uma década antes do crime, havia se abatido outra desgraça
em Aracaju, quando o acusaram — injustamente, pelo que se sabe — de colaborar
com os alemães que bombardearam navios na costa de Sergipe. Teve a casa
depredada e quase foi linchado.
“No vandalismo, que então se praticou, todo o enxoval de
Milena foi perdido. Para quem fosse supersticioso, isso seria considerado mau
augúrio para o casamento”, escreveu o general Bragança.
O baiano Afonsinho, assim carinhosamente conhecido, era
amigo e frequentador da casa dos Firpo. Ele foi do Grupo de Aviação de Caça,
era boa pinta e brilhante profissionalmente. Chegou a ser um dos oficiais
aviadores da Presidência da República, no governo João Goulart. Foi caçado pelo
Ato Institucional número 1, após o 31 de março de 1964, sendo transferido compulsoriamente
para a reserva, já como brigadeiro. É falecido.
Na noite do crime, a vítima estava só no seu quarto. Dona
Milena dormia com as duas filhas, Julieta e Maria da Graça, pois uma delas
estaria doente. O sogro Nicola e a doméstica Gilena também estavam na casa. O
fio do telefone havia sido cortado criminosamente. Após as investigações
coordenadas pelo próprio Leandro Maciel, a polícia mandou prender dois
indivíduos que tinham sido indiscretos em suas conversas perante um motorista
de praça que os transportava para a cidade de Paulo Afonso, terra natal de
Afonsinho.
Um dos detidos, o magarefe José Euclides Timóteo de Lima,
que na noite do crime teria ficado de atalaia na esquina da rua Campos com Dom
José Thomás, foi espancado até a morte num terreno baldio da Jabutiana, após
finalmente ter incriminado Afonsinho.
Foi torturado pelos policiais de vulgo Alemão, Zé Rosendo e
Carniceiro, sob a “direção pessoal do secretário do Interior e Justiça, Dr.
Heribaldo Dantas Vieira, atual senador por Sergipe, com a presença do atual
deputado federal João de Seixas Dória, do secretário de Segurança Dr. Antônio
Machado e do Dr. Humberto Napolioni Mandarino, cunhado do Dr. Firpo”, segundo
relatou o general Bragança, no seu livro editado em Belo Horizonte poucos anos
depois do crime.
“Apesar de terem conseguido essa confissão feita no estertor
da morte, foi pedida a prisão preventiva para todos os que ocupavam a
residência do Carlos Firpo no dia do seu assassinato, exceto suas filhas
menores”.
Dona Milena passou dois anos no reformatório penal, após
fazer uma confissão que também teria sido forjada. Ela teria confessado um
suposto romance com o coronel aviador. Afirmando depois que não disse o que
constava no depoimento, foi absolvida em juízo. Sua assinatura no depoimento a
Heribaldo Vieira, inclusive, teria sido falsificada.
O clamor que se criou contra ela também provocou piedade. O
poeta Antônio Garcia Filho compôs uma música em sua homenagem, “Injustiçada”,
que foi gravada por Alcides Gerardi.
O outro preso em Paulo Afonso, José Pereira dos Santos, o
Pereirinha, acabou sendo condenado a 20 anos de reclusão como autor material do
crime. Ele teria esfaqueado o médico Carlos Firpo. Mas o verdadeiro mandante,
que supostamente teria sido Afonsinho, até hoje permanece sob mistério.
Suspeita-se que um cunhado dele teria contratado os assassinos.
Quase 51 anos depois o crime permanece um mistério.
Texto e imagem reproduzidos do site: infonet.com.br
Gostaria de saber se tem ainda algum personagem desse acontecimento vivo .
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