quinta-feira, 16 de julho de 2020

Oi, Zé Fernandes: memórias de sextas de confraria

Imagem reproduzida da TV Sergipe e postada pelo blog para ilustrar o presente artigo

Texto publicado originalmente do site JLPOLÍTICA, em 15 de julho de 2020

Opinião - Oi, Zé Fernandes: memórias de sextas de confraria

Por Maria Nely Santos Ribeiro * (Coluna APARTE)

Por que sentimos o coração esmagado quando perdemos uma pessoa querida? Assim que soube da partida de José Fernandes, sinto-me dessa maneira, viu “grandalhão”. Meu artista plástico dono de um “vozeirão” inconfundível. É, amigo Zé, se o coração sangra, a razão restabelece os bons momentos que a vida nos proporcionou. A tristeza de agora substituo pela incomensurável alegria vivenciada na “Confraria do Cajueiro”, agregada ao restaurante do Cajueiro, no Conjunto Inácio Barbosa.

Toda sexta-feira, tão logo o relógio marcava 11h, você ligava indagando: e aí Nely, você está vindo? Desde 2001, chegava antes dos demais confrades para, sem muito barulho, desfrutar de sua companhia para boas conversas. Bebericando a cerveja geladíssima servida por Paulinho, colocávamos as novidades da semana na ordem do dia. Devagarinho os confrades iam chegando de modo que, lá pelas 13 h, as mesas dispostas horizontalmente, já estavam ocupadas.

A algazarra controlando o burburinho só era amenizada quando sanfoneiros e violonistas estavam lá. O habitual era ouvir o seu vozeirão sobressaindo. De acordo com você, àquela época Presidente da Confraria,  “tudo começou de modo informal, com ele e o falecido jornalista e advogado Carlos Mota, quando se reuniam no bar do Cajueiro para discutir política, mas todo assunto terminava direcionado para artes e cultura”.

O tempo atravessou o tempo. Estimulados por você (presidente) e Antônio Torres (vice), todas as sextas-feiras, nós, os confrades, preservamos o gesto prazeroso do encontro, da convivência em grupo, o compartilhamento e discussão de ideias. Para integrar a Confraria, o proponente passava por um ritual qual seja, tomar de uma golada só um copinho de gengibirra (cachaça). Meu paraninfo foi o professor do Departamento de Letras/UFS, José Costa. Sob a sombra do frondoso cajueiro espreitando silencioso as águas do rio Poxim, vivenciei reuniões agradáveis e bem frequentadas pelos o advogado Elito Vasconcelos, o publicitário Antônio Leite, os professores José Costa, Mauricio Neves, José Roberto, Ludwig Oliveira, Luiz Alberto, os jornalistas Carlos Marcelo, Garcez Junior, Osmário Santos, Luduvice José, o fotógrafo Márcio Garcez, Romildo Rodrigues, Lúcia Falcón, Rosaly Nunes, Riso França o poeta Marcelo Ribeiro, Alberto Jorge Figueiredo (jornalista) Erivaldo de Carira, Zé Américo e inúmeras outras pessoas.

O bom e impagável sempre era a sua presença marcante e instigante, sua luta para valorizar a cultura sergipana em todos os segmentos e matizes. Em setembro de 2007, lecionando na Universidade Tiradentes a disciplina História do Pensamento e da Cultura Sergipana, criei o Projeto Cajumã. Uma das atividades “Dois dedos de Prosa”, realizada pelos alunos, consistia de entrevista e bate-papo com escritores, poetas, cordelistas, músicos, atores e atrizes, artistas plásticos. Você foi nosso convidado.

Entusiasmados eu e os alunos, encontramo-nos com você numa tarde de terça-feira, ao ar livre, na área livre do bar da Mangueira (Bairro Inácio Barbosa). De maneira simples, sem rapapés, falou para os alunos sobre sua arte enquanto concomitantemente pintava seu quadro. Que tarde enriquecedora, maravilhosa! A prova material da aula, do seu desprendimento e carinho por mim foi o quadro que me presenteou. Zé: ele está aqui na parede da sala. Obrigada, pelo carinho com que nutriu nossa amizade. Adoto as palavras de sua amada esposa Cintia, “você resolveu pintar o céu para deixa-lo mais colorido”.

* É historiadora.

Texto reproduzido do site: jlpolitica.com.br

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