quarta-feira, 27 de fevereiro de 2019

Exposição “Tempo de Contar” celebra Centenário de Joel Silveira

 Fonte da Foto: Revista Manchete

Joel Silveira foi correspondente dos Diários Associados na Segunda Grande Guerra
Fonte da Foto: Agência Nacional

Publicado originalmente no site do CINFORM, em 19 de fevereiro de 2019

Exposição “Tempo de Contar” celebra Centenário de Joel Silveira

Da Redação 
    
Por Suyene Correia [suyenecorreia@cinform.com.br]

Apesar de seu nome estar estampado numa das pontes mais importantes de Sergipe, de  ter sido um dos poucos correspondentes brasileiros na Segunda Grande Guerra, ser considerado um dos mais importantes jornalistas do Brasil e um dos precursores do “New Journalism”, Joel Silveira ainda é uma personalidade desconhecida para muitos de seus conterrâneos.

Por isso, a exposição “Tempo de Contar- Centenário de Joel Silveira”, em caráter permanente, na Biblioteca da Universidade Tiradentes (UNIT), Campus Farolândia, tem como um dos principais objetivos, oportunizar ao público que circula pelo prédio, um contato com a história desse ilustre sergipano.

Dividida em dois núcleos, a exposição sob a curadoria da historiadora Sayonara Viana e da diretora da Biblioteca da UNIT, Maria Eveli Pieruzi de Barros Freire, conta com uma parte introdutória, em que através de uma linha do tempo, é possível acompanhar fatos marcantes da vida desse lagartense, nascido no dia 23 de setembro de 1918.

O segundo núcleo é dedicado ao Memorial Joel Silveira, onde se encontra parte da sua biblioteca particular, assim como fotografias, bilhetes de personalidades da área artística, medalhas, troféus e diplomas recebidos ao longo da sua carreira profissional.

O acervo de Joel Silveira chegou em agosto de 2018, à UNIT, a partir da doação da filha do homenageado, Elizabeth Silveira. Ela pensou em doar o acervo pessoal do pai para a Biblioteca Nacional, mas ao ser convidada para participar de evento comemorativo do centenário de nascimento de Joel Silveira, na Universidade Tiradentes, preferiu que esse rico material viesse para Sergipe.

Durante três meses, os quase seis mil itens do acervo foram tratados, higienizados e catalogados por uma equipe especializada na própria universidade particular. A partir daí, começaram os trabalhos de seleção dos itens que serviriam para a exposição, tendo em vista que era um material muito diverso, da década de 1930 até a morte do jornalista, no dia 15 de agosto de 2007.

“Pesquisando sobre sua obra completa, escolhemos ‘Tempo de Contar’ (1985) para auxiliar na narrativa da exposição, que começa pela infância, seguindo pelo início dos trabalhos como jornalista e escritor, até sua participação como correspondente da Segunda Grande Guerra. Em várias entrevistas, inclusive, Joel Silveira disse que amadureceu muito durante essa cobertura. Ele voltou, aparentemente, mais velho, mais maduro e com um texto mais brilhante”, explica Sayonara Viana.

A acidez dos seus textos fez com que recebesse a alcunha de víbora, pelo chefe Assis Chateaubriand, que lhe dá como primeira missão, nos Diários Associados, a possibilidade de cobrir a Segunda Guerra Mundial. Mas antes de chegar a esse ponto alto da carreira do jornalista sergipano, o visitante percorrerá um caminho definido pelas curadoras, através de plotagens nas paredes- idealizadas pela designer Gabi Ettinger-, onde é possível acompanhar sua trajetória de vida, da infância até a fase adulta, bem como frases de sua autoria, de jornalistas que apreciam o seu trabalho e até uma poesia, “Quantos Caminhos Há no Mundo”, enviada para seu irmão Paulo, quando Joel já morava no Rio de Janeiro.

Com apenas 14 anos de idade, Silveira já escrevia em “A Voz Operária” e liderava o Grêmio Literário Clodomir Silva, do Colégio Atheneu Pedro II. Também chegou a escrever em “A Voz do Atheneu” e, em 1936, escreveu seu primeiro romance “Desespero”, sendo contemplado com o prêmio Clodomir Silva. Com 19 anos, partiu no navio Itagiba em direção ao Rio de Janeiro, a fim de estudar Direito e se distanciar do pai que tinha pensamentos “burgueses” demais para o gosto do jovem esquerdista.

Lá, começou a trabalhar no “Dom Casmurro”, a mais importante publicação literário-jornalística dos anos de 1930, que contava com nomes ilustres, a exemplo de Carlos Lacerda, Rachel de Queiroz, Aníbal Machado, Cecília Meireles, Graciliano Ramos, Jorge Amado.

Após esse contato com parte da intelectualidade carioca, Joel Silveira trabalharia ainda na revista Diretrizes, onde escreveria uma crônica “1943: Eram assim os Grã-finos em São Paulo”, chamando a atenção de Assis Chateaubriand, que o contratou tempos depois para os Diários Associados. Foi aí, que o jornalista sergipano se notabilizou no jornalismo brasileiro, como o correspondente estrangeiro mais jovem (26 anos) a cobrir a Segunda Guerra Mundial.

Na primeira parte da exposição, é possível conferir algumas fotos do jornalista no front italiano, onde passou 10 meses e cuja experiência singular, pode ser conferida no livro “Inverno da Guerra”, lançado em 2005. Além disso, também foram plotadas caricaturas dos amigos Manuel Bandeira e Cândido Portinari, a partir dos originais, presenteados por Augusto Rodrigues.

Mas é na sala reservada para o Memorial Joel Silveira, propriamente dito, que a exposição ganha força. A primeira coisa que nos deparamos, quando entramos no recinto, é a famosa estante da “Víbora” que continha um compartimento central, onde ele guardava suas garrafas de uísque 12 anos. Nesse móvel, que foi totalmente reformado, é possível encontrar em suas prateleiras, clássicos da literatura universal e brasileira, além da bibliografia completa do jornalista (foram 47 títulos).

Alguns troféus e prêmios importantes também chamam a atenção dos visitantes, a exemplo do Jabuti de 1986, concedido ao autor pelo lançamento de “Tempo de Contar”; o VI Prêmio Líbero Badaró- Destaque do Ano e uma peça em azulejo tendo o rosto de Joel Silveira, pintada por Rosa Faria, na época em que ele foi Secretário de Cultura do Estado de Sergipe, no final dos anos de 1980.

Numa das paredes do Memorial é possível observar fotos de Joel Silveira com familiares (irmãos, esposa, filhos e netos); com colegas de trabalho, como a icônica foto com os escritores que trabalhavam no Dom Casmurro; na cobertura da Segunda Grande Guerra e como correspondente internacional da revista Manchete, onde trabalhou 16 anos, tendo como chefe Zevi Ghivelder.

Também expostos na parede, é possível ler alguns bilhetes endereçados a Joel Silveira, por amigos ilustres como Aníbal Machado, Rubem Braga, Drummond, Caymmi, Jânio Quadros e Di Cavalcanti. Não faltam diplomas, medalhas, prêmios e até mesmo um certificado inusitado: o Título de Primeira Linha da Panair 1952, por ser um passageiro assíduo da empresa aérea.

Como se não bastasse tudo isso, várias estantes de ferro que ocupam a parte central da sala acolhem, em suas prateleiras, os livros que um dia Joel Silveira folheou. É possível encontrar títulos em várias línguas como japonês, russo, alemão, francês e inglês. Mas a maioria das publicações, que podem ser consultadas pelos visitantes, está em português, sendo algumas edições raras e até autografadas pelos autores.

A exposição de caráter permanente pode ser visitada de segunda a sexta-feira, das 8 às 12h e das 14 às 18h, na Biblioteca da Universidade Tiradentes- Campus Farolândia. O acesso é gratuito.

Texto e imagens reproduzidos do site: cinform.com.br

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2019

Amorosa : "O calvário de uma história escrita com risos e lágrimas"


Publicado originalmente no site do JORNAL DA CIDADE, em 11 de fevereiro de 2019

Entrevista

Amorosa : "O calvário de uma história escrita com risos e lágrimas"

A exposição ‘No Coração de Alguém de Esteve Aqui’, em homenagem ao cinquentenário do poeta Araripe Coutinho, acontece na Galeria Jenner Augusto, até o dia 30 de março. Para a construção do caminho que coloca toda nudez revelada do poeta, da palavra ao corpo, um esforço coletivo da amiga Antônio Amorosa e do trio de profissionais Ana de Cáscia Martins, Hélio Aguiar e Luciana Galvão. É arte, cor, arquitetura e design de interiores na concepção e materialização do pensamento despido, do brilho intenso da ‘Estrela’, do ser humano leve de passagem breve, marcante e ensino permanente. É sobre a montagem, as lembranças, a saudade, as vontades e muito mais de Araripe Coutinho que Antônia Amorosa conversou com o JORNAL DA CIDADE. Boa leitura!

JORNAL DA CIDADE - exposição ‘No Coração de Alguém que Esteve Aqui’ despe em letras, ambientes e cores a presença do poeta Araripe Coutinho?
Antônia Amorosa - Sim. Ela traz a força da sua poesia, a generosidade do seu coração, a intensidade das suas ações, o calvário de uma história escrita com risos e lágrimas, que merece ser revisitada para ser melhor compreendida.

JC - Como se deu a construção do caminhar aos passos do poeta?
AA - Desde o dia em que seu pai me pediu para cuidar do seu acervo, que disse a ele do meu desejo de fazer uma exposição que desse às pessoas, a oportunidade que eu tive: conhecer seus múltiplos talentos, seus defeitos como suas virtudes, e entender por que seus aparentes excessos diziam mais sobre uma criança abandonada do que sobre um poeta. Quis montar esta exposição sob o olhar técnico e criativo de arquitetos e design de interiores, para revelar o menino, o poeta, o jornalista, o filho, o religioso, o cidadão comprometido com ações sociais e o ser humano que foi mal interpretado, merecendo ser realmente conhecido em sua nudez real.

JC - Inclusive, é pelo transitar e vivenciar vida e obra dele que a visitação é limitada?
AA - Não há limitação - apenas organização para promover um melhor conforto aos visitantes. Mas, qualquer pessoa que chegar de quarta a sábado, das 18h às 21h, no Espaço Semear, terá livre acesso, seguindo uma ordem de chegada.

JC - Feita a várias mãos, a mostra vai desde o que era público e notório ao que era reservado a amigos. Como foi e tem sido esse (re) encontro com as lembranças?
AA - Construir esta exposição ao lado de profissionais como Ana de Cáscia Martins, Hélio Aguiar e Luciana Galvão, tendo também a participação de Marianna Albuquerque foi, de fato, um profundo e emocionante mergulho, onde choramos várias vezes, sonhamos com ele, tivemos inspirações surpreendentes que resultaram em tudo que está presente nesta exposição. O mercado de arquitetura e design de interiores abre um novo caminho em Sergipe através deste emocionante trabalho.

 JC - Toda a ‘nudez’ (do corpo ao pensamento liberto!) de Araripe Coutinho se faz presente e respeitada em cada ambiente?
AA - Poucas pessoas sabem que Araripe era filho de uma índia, portanto, não encarava a nudez como nós! Para ele era tão natural como beber água. Andava nu em casa e recebia os amigos apenas com um lençol sobre seus ombros. Sobre o polêmico ensaio, o público se surpreende quando coloca os olhos numa fechadura e se depara com doze modelos seminus, usando a flor amarela, para questionar se as pessoas viram a arte ou o seu preconceito. O nu humano é lindo! Nós é que temos que aprender a enxergar com leveza.

JC - Há pretensão de levar a exposição para outros lugares, seja em Sergipe ou em outros estados?
AA - Somente Deus, eu e meus bons amigos sabemos do quanto renunciei ao meu trabalho de sobrevivência para realizar esta exposição porque fazer arte é missão, não é lucro. Bati em muitas portas, mas nem todos me apoiaram. Os que o fizeram estão registrados na entrada da exposição ou no livro de depoimentos. Matei um leão por dia, para esta exposição sair. E os profissionais caminharam lado a lado, cada um dando sua contribuição. Porém, quando Deus está num projeto, se Ele diz sim, quem não soma, perde uma grande oportunidade de se revelar grande. Quer conhecer alguém? Observe como trata com a cultura, o alto nível da educação. Quanto à continuidade, o acervo literário será doado ao Centro Cultural para que as pessoas possam ter acesso. Não tenho forças para manter esta exposição de forma permanente ou itinerante. Quem visitar, verá o tamanho da luta que foi travada, mas também verá o tamanho da nossa fé! A boa vontade muda qualquer coisa de lugar. Os homens é que têm sido frios com os homens. E o amor precisa mudar isso! Esta é uma exposição que prova o significado de uma verdadeira amizade.

JC - O que ainda vem por aí na celebração ao cinquentenário do poeta?
AA - A exposição segue até dia 30 de março. Após isto, faremos o procedimento oficial de entrega do acervo literário. A mobília terá um destino solidário, como sei que ele faria. Também lançaremos o site oficial com todas as suas obras, artigos e fotos que dispomos. Pretendemos também, se Deus me der forças, lançar o Concurso Literário Virtual “Araripe Coutinho”, no próprio site, para estimular novos escritores. Após isto, poderei olhar para o céu, procurar a primeira estrela e dizer: poeta, tudo que eu pude fazer para que nosso povo entendesse sua passagem pela terra, eu fiz. Agora, irei cuidar de mim e levar seu pai, de vez em quando, para ver o rio. Porque amar é uma escolha. E eu não acredito em nenhum amor que não sobreviva à morte.

Texto e imagem reproduzidos do site: jornaldacidade.net

Vi a despedida de Athila, por Sebastião de Sá Figueiredo

Foto: Reprodução

Publicado originalmente no site do CINFORM, em 10 de fevereiro de 2019

Vi a despedida de Athila
Por Sebastião de Sá Figueiredo*

Acho que foi ele, o menino lagartense Athila Paixão, que vi domingo passado no Aeroporto de Aracaju. Havia um bocado de pessoas, possivelmente familiares vindos do povoado Brasília, Lagarto, que estavam ao seu lado no saguão do lugar vestidas com a camisa do Flamengo.

Faço agora a associação, porque o noticiário da tragédia do Ninho do Urubu diz que ele viajou de volta no domingo à tarde para o Rio. Em algum momento me detive no rosto do menino, porque seu tipo físico chamava a atenção, além das pessoas ao seu lado.

Também olhava para outras pessoas além daquele grupo, igualmente jovens, supondo que algumas delas iam embora definitivamente de Sergipe.

Quase menino fui embora para buscar vida nova em outra cidade. Fui e voltei depois de rodar meio mundo afora. Alguns de meus irmão não voltaram, assim como outros parentes.

Enquanto ficava mais tempo no lugar, permita-me viajar entre aspas, chegava mais avião e provavelmente Athila Paixão estava despachando sua bagagem com a família ansiosa.

Ninguém sabia o que viria depois. Apenas estávamos ali, desdenhando da vida. Fazia tempo que não ia ao Aeroporto e àquele domingo tinha sido uma opção acertada e casual para me distrair.

Lembrei, fazia tempo, de uma despedida no Aeroporto de Maceió, quando viajei para um país da Cordilheira dos Andes e teria que ficar por quase um ano longe de meus dois filhos. Vendo-os de longe, sofregamente, enquanto subia pela rampa da aeronave, em 1983.

Depois de tanto mexer com a emoção, era hora de ir embora nesse domingo; afinal, meu filho me esperava para gozar os últimos momentos do dia e se preparar para a aula de segunda-feira.

Enquanto isso, imaginava que o rapaz de 14 anos, que vestia a camisa da base do Flamengo, deveria estar chegando ao seu destino. Lá, onde ele buscava a vida e acabou chegando, dias depois, à estúpida morte com mais nove jovens atletas, infelicitando a não só desportistas brasileiros.

Eita mundo não tão surpreendente!

Sobre o Autor:
* Sebastião de Sá é professor aposentado dos cursos de Comunicação Social na Universidade Federal de Sergipe. Ex-presidente da Adufs (gestão 1995), o entusiasta do radialismo ajudou a trazer e a inaugurar os cursos de Rádio e Jornalismo no estado.

Texto e imagem reproduzidos do site: cinform.com.br