domingo, 27 de abril de 2025
'Rosa Faria: arte e história como missão', por Acácia Rios
quarta-feira, 9 de abril de 2025
Memória > Manuel Pascoal Nabuco d’ Ávila
Artigo compartilhado do site [portalweb mpse mp br/Memorial], de 24 de novembro de 2016
Memória > Manuel Pascoal Nabuco d’ Ávila
Manuel Pascoal Nabuco d’Ávila, filho de João Nabuco d’ Ávila e Maria de Lourdes Nabuco d’ Ávila, nasceu em Riachuelo/SE, no dia 17 de agosto de 1937. Viveu a meninice em Riachuelo, estudando as primeiras letras no Educandário Nossa Senhora da Conceição e no Grupo Escolar Francisco Leite, ambos em Riachuelo, onde seu pai era Coletor Federal. Em 1951, com a transferência do pai, a família transferiu-se para Estância. Manoel Pascoal Nabuco d’ Ávila, com 13 anos, passou a viver entre a família, naquela cidade, e os internatos dos Colégios Jackson de Figueiredo e Tobias Barreto, onde concluiu o curso secundário (Ginásio e Científico, hoje Ensino Fundamental e Médio).
Em 1957 fez Vestibular para a Faculdade de Direito de Sergipe, bacharelando-se com a turma de 1961, da qual participaram Ariosvaldo Figueiredo, histotirador recentemente falecido, José Amado Nascimento, professor e intelectual, José Arnaldo da Fonseca, aposentado como Ministro do Superior Tribunal de Justiça – STJ, Pedro Iroito Dória Leó, Procurador do Ministério Público, em vias de aposentadoria, Thiers Gonçalves de Santana, professor e Juiz de Direito, já falecido, dentre muitos outros. Nas salas de aula desfilavam nomes ilustres de professores, como Monsenhor Dr. Alberto Bragança de Azevedo, Manoel Cabral Machado, Manoel Ribeiro, pai do escritor e acadêmico João Ubaldo Ribeiro, Francisco Leite Neto, que foi Deputado Federal e Senador, Renato Cantidiano, depois professor na Faculdade Nacional de Direito, no Rio de Janeiro, Garcia Moreno, e muitos outros, sob a coordenação magnífica do Diretor e professor Gonçalo Rollemberg Leite.
Já acostumado ao ir e vire de Estância, no meio do curso de Direito, em 1959, resolveu fixar residência naquela cidade, atuando na imprensa local, como fazia em Aracaju, no jornal da própria Faculdade, o Academus e na Gazeta Socialista, mais tarde convertida em Gazeta de Sergipe, cuja direção, exercida, apaixonadamente, por Orlando Dantas, atraía para a redação intelectuais e jovens sedentos de mudanças, para o mundo, para o País e para o Estado.
Manuel Pascoal Nabuco d’Ávila foi fisgado pela política partidária da Estância, filiando-se ao Partido Trabalhista Brasileiro – PTB, que tinha, no Estado, a liderança de Francisco de Araújo Macedo, velho militante da agitação política, desde a década de 1930, apoiando a gestão interventorial de Augusto Maynard Gomes, editor do jornal O Nordeste, com forte presença na Estância, onde orientava o jornal Folha Trabalhista. No PTB, Manuel Pascoal Nabuco d’Ávila participaria da redação do jornal trabalhista estanciano e preparava uma candidatura a Prefeito.
O Brasil de 1962 estava conturbado. A renúncia de Jânio Quadros e a posse, negociada, do vice-presidente João Goulart, mexia com os grupamentos partidários e as tradicionais alianças e coligações. A UDN completava oito anos no Poder, e embora a gestão dos seus dois governadores fosse positiva e empreendedora, havia, em todo o Estado, um sentimento de mudança, de renovação, que parece ter a cada ciclo de mando. No plano estadual, então, aconteceu o inesperado: Parte da UDN, com Seixas Dória, Heribaldo Vieira, Albino Silva da Fonseca, defendia uma aliança com os velhos adversários PSD-PR, e mais com o Partido Socialista Brasileiro – PSB, de Orlando Dantas e parte do PTB, conduzida pelo prefeito de Aracaju, José Conrado de Araújo.
Leandro Maciel, que utilizou o slogan “Ninguém se perde na volta”, perdeu a eleição para Seixas Dória. Luiz Garcia perdeu a eleição para o Senado, e a UDN saía derrotada do pleito. A vitória de Seixas Dória enchia as novas gerações de políticos de esperança. Na Estância, derrotando o candidato da UDN – José Vieira Barreto, e o do PR – Partido Republicano – Marcelo Soares, filho do médico Pedro Soares, Manoel Pascoal Nabuco d’Ávila começava a colocar seu nome na história local, sendo eleito Prefeito Municipal prometendo, na praça pública, priorizar a Educação, a Saúde e o Desenvolvimento, trinômio essencial para a sociedade estanciana.
A atuação do Prefeito de Estância pode ser avaliada sob duas óticas, a primeira, interna, das providências para transformar a máquina pública em favor da comunidade, com a Organização da Lei Orgânica do Município, o Estatuto dos Servidores Municipais, o Código Tributário Municipal, o Código de Higiene e Saneamento, e o Código de Posturas Municipais, instrumentos da transformação política pretendida por Manoel Pascoal Nabuco d’Ávila. Foram muitas as providências em favor da educação, da cultura, da saúde, do saneamento, modernizando aquela cidade com serviços inovadores, como o Serviço Autônomo de Água e Esgoto.
A segunda ótica da administração do Prefeito de Estância pode ser considerada a partir da importância que deu à educação, melhorando as escolas do centro urbano e criando rede de escolas rurais, fortalecendo o ensino médio e valorizando a cultura. E, mais que isto, difundido entre os jovens, de Estância e do Estado, as idéias que davam sintonia com o Governo Seixas Dória, engajado na pregação das Reformas de Base, conjunto de ações reformadoras, para tirar o Brasil das velhas oligarquias que concentram o Poder e manipulavam a economia. Manuel Pascoal Nabuco d’Ávila fez conferências, esclareceu platéias jovens, visitou entidades, falou para o povo, enfim contribui com sua palavra e com seu exemplo, para alimentar entre os estancianos e entre os sergipanos a idéia das mudanças, que ainda tem fortalecido os discursos políticos dos candidatos.
O Presidente João Goulart foi deposto pelos militares que fizeram o movimento de 31 de março de 1964. Em Sergipe, na madrugada de 2 de abril, o Governador Seixas Dória foi deposto e preso, sendo levado para Salvador e depois para a ilha presídio de Fernando de Noronha. O Prefeito de Estância foi deposto e preso no dia 17 de abril de 1964. Começava a via crucis destes políticos e de milhares de brasileiros que sonhavam com as liberdades, o desenvolvimento, a reconstrução do País e a defesa e aproveitamento de suas grandes e últiplas riquezas.
Manuel Pascoal Nabuco d’Ávila foi preso duas vezes: a primeira, em 17 de abril de 1964, sendo liberado em 23 de junho do mesmo ano; a segunda, em 18 de setembro de 1969, quando foi julgado, na Auditoria Militar da 6ª Região, em Salvador/BA, e condenado a uma pena de 1 ano e 9 meses de detenção, dos quais cumpriu 8 meses de pena, pela revisão feita pelo Superior Tribunal Militar, julgando Recurso interposto pelo ex Prefeito de Estância.
De volta à Estância, já casado, com filhos, Manuel Pascoal Nabuco d’Ávila continua exercendo a advocacia, até ingressar no Ministério Público, graças ao concurso realizado em 1978. A demora na nomeação o obrigou a buscar, na Justiça, proteção ao seu direito de aprovado. O julgamento demorou muito, até o Governador Augusto do Prado Franco (1979-1982) o nomeou para a Comarca de Neópolis, de onde foi removido para a Comarca de Boquim, em 1980, de Propriá, em 1983, sendo promovido à Comarca de 2ª Entrância, removido para Estância, em 1984.
Com o retorno das eleições diretas para Governador do Estado, o nome de Manuel Pascoal Nabuco d’Ávila voltou a circular nos meios políticos. Hábil para dialogar, sempre disposto a conversar com amigos e com eventuais adversários, passou a influir nas administrações estaduais que nasceram das eleições diretas, como aquelas comandadas por João Alves Filho, de quem foi Secretário-Chefe da Casa Civil, sendo também Procurador Geral de Justiça, Antonio Carlos Valadares, como Procurador Geral de Justiça, e Albano do Prado Franco. Como Procurador Geral do Estado, sendo por este governador nomeado Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe.
Desde 1984, portanto, quando foi o primeiro dos integrantes do Ministério Público a chefiar a Procuradoria Geral de Justiça, que de uma forma ou de outra, fosse com suas opiniões, fosse com suas ações, serviu de interlocutor acreditado, elevando o debate político do Estado. A experiência como Promotor de Justiça e o trânsito livre com os novos governantes do Estado, após as eleições diretas de 1982, deram a Manuel Pascoal Nabuco d’Ávila a chance de contribuir para o fortalecimento do Ministério Público, a partir dos dispositivos contidos na Constituição Brasileira de 1988. E mais do que incorporar ao texto constitucional as prerrogativas que representaram, por muitos anos, a luta do Parquet, o então Procurador Geral de Justiça, valendo-se do acesso ao Governador Antonio Carlos Valadares elaborou Projeto, aprovado pela Assembléia Legislativa, de Lei Orgânica do Ministério Público, que foi, em 12 de novembro de 1990, quando sancionada a Lei Complementar 02, foi considerado um avanço e um pioneirismo para Sergipe e para o País.
Na solenidade em que foi sancionada a Lei Orgânica do Ministério Público, o Procurador Geral de Justiça Manuel Pascoal Nabuco d’Ávila disse:
Da minha parte, Senhor Governador, como o último dos Procuradores Gerais de Justiça em Sergipe a integrar o Poder Executivo, como membro do seu Secretariado, porque doravante o Procurador Geral de Justiça passa a ser Chefe de uma instituição independente, autônoma, que não mais integra qualquer dos Poderes do Estado, mas que vela pelo harmonioso funcionamento dos mesmos, como órgão fiscal de sua atuação, posso dizer que tudo fiz e dei de mim para alcançarmos esta meta, a de legar ao povo de Sergipe um Ministério Público altaneiro e forte, apto a lhe servir no processo de sua auto-afirmação como povo livre, consciente e democrata.
Passando mais de 15 anos como integrante do Ministério Público, acumulando todas as experiências, juntadas aos períodos que atuou nas administrações públicas estaduais, e, ainda, considerando sua atuação como advogado, como gestor público municipal, como jornalista e como cidadão politicamente engajado, Manuel Pascoal Nabuco d’Ávila chegou ao Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe, nomeado por Decreto do Governador Albano do Prado Franco, em 1996, disposto a coroar sua biografia de homem público, com a marca da opção de servir à sociedade.
No dia 5 de agosto de 1996, perante um auditório repleto de amigos e de admiradores, Manuel Pascoal Nabuco d’Ávila tomou posse como Desembargador, na vaga do professor e acadêmico Luiz Rabelo Leite, representante do Ministério Público no Tribunal de Justiça de Sergipe, desde a segunda metade da década de 1970. O simbolismo da posse, com todas as formalidades, coroava o esforço de uma vida dedicada à luta em favor da cidadania.
Diante daquele homem, amigos e admiradores, autoridades e colegas de Ministério Público, serventuários e juizes, todos reverenciavam a capacidade de resistir a todas as dificuldades encontradas pelo caminho da vida, e a férrea vontade de insistir na defesa das causas que abraçou, no curso do tempo. O Desembargador que tomava posse não diferenciava do jovem Prefeito de Estância, nem do advogado que patrocinava as suas próprias causas, para fazer prevalecer o direito.
No seu Discurso de posse, definindo-se, dentre outras coisas, disse:
O homem que recebem para compor este Egrégio Tribunal exerceu todos os papéis reservados aos participantes do drama humano com que Vossas Excelências estão acostumados a conviver cotidianamente em suas lides forenses: o do Réu, do Advogado e do Promotor. Por isso também dou graças a Deus, porque aqui chegando para exercer o dignificante papel de juiz, ao depois de haver exercido aqueles outros papéis, sinto-me capacitado para o desempenho de minhas futuras e nobilitantes funções.
Em tendo sido Réu, vivi suas angústias e aflições; mas que isso, sofri, na própria pele e tive angustiado o meu espírito, ante a importância do figurante que, sujeito aos sentimentos dos outros – advogados, promotores e juizes – vê sua vida depender da vontade daqueles, ao jurisdizerem como lhes pareceu mais acertado, decidiam o seu próprio destino.
Conheci o libelo e a condenação injustos e impostos pelo arbítrio e pelo totalitarismo dos que serviam aos donos do poder. Cumpri pena, consciente de que não a merecia. Amei ainda mais a liberdade, ocasionalmente a mim subtraída e busquei na cultura e na fé os freios inibitórios para a minha revolta. Recorri da decisão iníqua e purguei cadeia, por mais de oito meses, enquanto aguardava o julgamento de um Recurso. Vi meus familiares sofrerem. Melhor conheci os homens que, como diz Cícero, o grande orador romano, em sua maioria ‘São como andorinhas; acompanham-nos no verão da prosperidade e voam no inverno das aflições.’
Sofri os dissabores que acarretam as partes a morosidade da Justiça. Conheci as mazelas decorrentes da justiça ser odiamente aplicada, que não redime a pena, nem compensa os prejuízos da espera. Conheci a prepotência e a tolerância do juiz despreparado para o cargo, porque, subserviente ao sistema, estava mais preocupado em condenar, para servir aos potentados, que julgar ante a prova dos autos; mais disposto a encontro causa para a condenação que aplicar a justiça, como do seu dever.
Alcancei a liberdade pelo julgamento do Superior Tribunal Militar que, por unanimidade, me absolveu da imputação absurda que me fora feita, mas isso após oito meses de cumprimento de uma pena sem razões e sem causas, uma vez reformada a sentença iníqua e arbitrária.
Diante disto, e apesar disto, quis Deus que o juiz que Vossas Excelências empossam, tenha a tudo vivido e sofrido para dar mais valor a liberdade individual, a lutar pela prestação jurisdicional com mais eficiência e presteza, e a condenar todas as formas de arbítrios e pressões, partam de onde partirem, que procuram sufocar no Magistrado o dever de ser imparcial e justo, sereno e independente, corajoso e digno.
No Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe, o Desembargador Manuel Pascoal Nabuco d’Ávila tornou-se uma referência entre os seus pares, com atuação destacada nos diversos postos e funções que desempenhou, a começar como Corregedor Geral, na Mesa presidida pelo Desembargador Gilson Góis, de 3 de fevereiro de 1999 a 2 de fevereiro de 2001, quando é eleito e assume a Presidência do Tribunal Regional Eleitoral. A Frente do TER mais do que presidir a eleição de 2002, organizou e instalou o Centro de Memória Eleitoral, criado na gestão anterior, pelo Desembargador José Antonio de Andrade Góes, editou 100 anos de eleições em Sergipe, consolidando a história e a estatística eleitoral do Estado.
De volta ao Tribunal de Justiça é eleito, na sessão de 18 de dezembro de 2002, Presidente do Poder Judiciário do Estado de Sergipe, para o qual foi empossado no dia 3 de fevereiro de 2003.
No seu Discurso de posse, tratou, diretamente, da questão do Judiciário brasileiro, sempre atingido por críticas da mídia, mas sempre indeciso em algumas de suas posições. Para o novo Presidente do Tribunal de Justiça, que abarca em sua fala vários aspectos que estavam na ordem do dia dos debates nacionais, a visão estava clara:
(...) Afinal, de que se acusa o Judiciário Brasileiro? De ser caro, de difícil acesso, moroso e ineficiente. Mas, mesmo se conhecendo as causas da sua morosidade e de sua ineficiência, nada se faz para erradicá-las. Deixa-se até de reconhecer que os problemas do Judiciário decorrem da atitude dos outros poderes do Estado, até porque a cultura dominante é no sentido do Executivo descumprir contratos, desrespeitar direitos e abusar de ações e recursos desarrazoados, abarrotando o Judiciário de processos inadmissíveis.
Destarte, se o Governo cumprisse os contratos, respeitasse as leis, as normas constitucionais, os direitos dos cidadãos, inexistiria excessos de ações judiciais e os Tribunais Superiores não estariam abarrotados de recursos repetitivos e protelatórios interpostos pela União, Estados e Municípios, suas empresas e autarquias que objetivam apenas retardar o cumprimento das decisões judiciais. Por outro lado, se não estivessem os grandes devedores convencidos, como estão, suas obrigações, a demanda do Judiciário seria bem menor. Se não fosse o nosso sistema recursal absurdo, o Judiciário estaria a salvo da acusação de eternizar as lides. Enfim, se tivéssemos um numero de juizes compatível com a população usuária de serviços forenses e, se dispusesse o Poder de recursos materiais e humanos, a sua situação seria bem outra. Por fim, se todas as sentenças tivessem efeito mandamental, evitando-se o desnecessário processo de execução, a prestação jurisdicional seria mais efetiva, muito menos onerosa e mais barata.
O novo Presidente do Tribunal continua com sua leitura crítica da realidade brasileira, ligada ao Poder Judiciário, e diz:
(...) Sabe-se, de antemão, que não queremos o Judiciário tendo como função precípua a de acomodar a classe média e a de reprimir os pobres e marginalizados, como aliás sugere o capitalismo internacional, através da reforma que propõe o Banco Mundial para o Judiciário Latino-Americano.
É imprescindível que se lute por um Judiciário garantidor do Estado Democrático de Direito, tendo como função prioritária à estabilidade e continuidade democrática.
Importante dizer que devemos dotar o Judiciário brasileiro de adequadas estruturas para uma democracia moderna.
Deve-se ressaltar que o Judiciário, como qualquer outra instituição, não pode ter uma única função. É possível afirmar que é função manifesta do Judiciário, a jurisdição, ou seja dizer o direito. Dirimir conflitos é função manifesta do Judiciário. Mas não se pode olvidar de que outras funções lhe são cometidas: a de autogoverno e a da Justiça Constitucional, qual seja a de tutelar os direitos fundamentais e o controle constitucional das leis, advertindo o citado professor argentino que – ‘não é possível decidir conflitos sem uma prévia interpretação a lei (o que implica tomar em consideração as normas constitucionais que coroa o edifício na qual a lei se acha imersa), que, inevitavelmente, implica um âmbito de controle sobre o legislador ou uma correção constitucional no alcance de suas palavras”.
Na presidência do Tribunal de Justiça dinamiza a prestação da Justiça, cria a instala Fóruns Integrados, onde, no seu próprio dizer, “dezoito juizes prestam serviços gratuitos que abrangem Registro de Nascimento e Óbito, Casamentos, Ações de Alimento, de Investigação de Paternidade, Separação e Divórcio, Arrolamento de bens, Ações Possessórias e de Usucapião, Ações Cíveis, cujo valor não ultrapasse 40 salários mínimos, assim como o julgamento de crimes de menor potencial ofensivo”, tudo para tornar mais célere os serviços do Judiciário sergipano. Melhorou as instalações, nas várias Comarcas, construiu e reformou prédios de Fóruns, criou novas Varas, ampliou o diálogo com diversos segmentos da sociedade e dedicou atenção especial à cultura, com duas de suas obras, que têm especial importância, tanto para o próprio Poder Judiciário, como para o Estado e o povo de Sergipe: O Memorial do Poder Judiciário e o prédio sede do Arquivo do Judiciário.
Para instalar o Memorial do Poder Judiciário, com uma exposição permanente, foi restaurado, cuidadosamente, o velho edifício do Tribunal de Relação, exemplar da arquitetura do final do século XIX, localizado na Praça Olímpio Campos, nomeado pelo Desembargador Manuel Pascoal Nabuco d’Ávila como Palácio Silvio Romero. O Arquivo Judiciário ganhou um prédio novo e próprio, projeto arquitetônico grandioso, para abrigar e manter o acervo que desde 1982 vem sendo criteriosamente reunido e que atende as demandas internas e serve à pesquisa histórica. Os dois equipamentos – o Memorial e o Arquivo – contribuem para melhor conhecimento da história e do funcionamento do Poder Judiciário de Sergipe.
Aposentado desde 2007, quando completou 70 anos, o Desembargador Manuel Pascoal Nabuco d’Ávila foi substituído pelo advogado e militante da OAB de Sergipe Edson Ulisses de Melo.
Escrevendo em vários jornais, proferindo conferências, algumas delas publicadas, e discursos, igualmente divulgados graficamente, o ex-presidente do Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe, assinando-se apenas Pascoal Nabuco publicou Tributo à cidadania – Minha opção de servir à sociedade (Aracaju: Gráfica e Editora J. Andrade, 2006), e atualmente tem trabalhado com a releitura da história política de Sergipe.
Enquanto exercia a Presidência do Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe, o Desembargador Manuel Pascoal Nabuco d’Ávila assumiu, em 29 de maio de 2004, o Governo do Estado, por sete dias, na condição de terceiro na linha sucessória. A Vice-governadora Marília Mandarino estava licenciada e o Presidente da Assembléia, deputado Antonio Passos, estava na Europa, acompanhando o Governador João Alves Filho, em viagem de contatos para novos investimentos no Estado. Para o Governador, além do “carinho muito grande pelo Desembargador Pascoal Nabuco, com que aprendi a conhecer no dia-a-dia como chefe da Casa Civil” havia o respeito mútuo e a convivência salutar com o Poder Judiciário.
No seu pronunciamento, o Desembargador disse que era “Feliz do povo cujos chefes dos poderes constituídos vivem em harmonia e mútuo respeito integrados todos na governabilidade do Estado, visando o desenvolvimento e o bem estar de sua população”.
O Desembargador Manuel Pascoal Nabuco d’Ávila recebeu inúmeras homenagens, destacando-se aquela da Universidade Tiradentes, a Medalha do Mérito Parlamentar, da Assembléia Legislativa do Estado, a Medalha João Nascimento Filho, da Câmara Municipal de Estância, o Título de Cidadão Estanciano, da mesma Câmara Municipal, e a Medalha da Ordem do Mérito Serigy, no grau de Comendador, da Prefeitura de Aracaju, a Medalha da Ordem do Mérito Aperipê, no grau de Comendador, concedida pelo Governo do Estado, o Colar do Mérito Tobias Barreto, do Ministério Público do Estado de Sergipe, que guarda como demonstração de apreço e de estímulo ao seu esforço em favor da cidadania. (LAB)
Texto reproduzido do site: portalweb mpse mp br/Memorial
segunda-feira, 31 de março de 2025
(...) Caso da expulsão dos estudantes do Atheneu em 1964
domingo, 30 de março de 2025
"Hermes-Fontes: um poeta e gênio atormentado", por Acácia Rios
Artigo compartilhado do site SÓ SERGIPE, de 21 de fevereiro de 2025
Hermes-Fontes: um poeta e gênio atormentado
Por Acácia Rios (*)
E saber que eu julguei que essa insensível
pudesse amar-me como a um seu irmão!
e possibilitei nesse impossível
dar forma eterna à minha aspiração!
Esfinge, esfinge! desgraçadamente.
maior, mais vasto que o deserto ambiente
é o deserto que tens no coração.
Esfinge, Hermes Fontes
Onome Hermes-Fontes atravessa a vida dos aracajuanos. As inúmeras placas ao longo dos seus 4 quilômetros, aproximadamente, não deixam esse sergipano de Boquim passar despercebido. Ainda mais para uma criança que acabara de aprender a ler. O mundo se me abria e as placas se tornavam parte do meu jogo do contente, que, no trajeto da antiga Cohab ao Centro, consistia em admirar as belas casas da avenida e memorizar os outros nomes com os quais a longa via fazia esquina.
Anos depois, Hermes-Fontes (o autor grafava seu nome com hífen, sintetizando assim o de batismo: Hermes Floro Bartolomeu Martins de Araújo Fontes) saltaria da placa para a página de um livro. Eis que me vejo diante de ‘A taça’ (título pelo qual ficou conhecido), um poema visual que faz uma ode a esse objeto.
Tornou-se o poema mais conhecido dele, presente em várias antologias, uma delas a de José Costa, que foi meu professor de Literatura Brasileira na UFS e organizou o livro Antologia poética de Hermes Fontes, editada pela Secretaria de Estado da Cultura em 2004.
A descrição da taça, que vai se confundindo progressivamente com uma mulher, é carregada de sensualidade e musicalidade. Começa e termina com versos dodecassílabos (doze sílabas), mas a métrica varia ao sabor do desenho da taça, estreitando a rima na haste, de forma que temos versos de apenas uma palavra, como o leitor pode observar.
A característica heterométrica (métricas diferentes) é o que o aproxima da poesia moderna. Essa sua versatilidade (e criatividade poética, diga-se de passagem), permitia-o transitar entre escolas.
Pouco acima daquela alvíssima coluna
que é o seu pescoço, a boca é-lhe uma taça tal
que, vendo-a, ou vendo-a, sem, na realidade, a ver,
de espaço a espaço, o céu da boca se me enfuna
de beijos — uns, sutis, em diáfano cristal
lapidados na oficina do meu Ser;
outros — hóstias ideais dos meus anseios,
e todos cheios, todos cheios
do meu infinito amor…
Taça
que encerra
por
suma graça
tudo que a terra
de bom
produz!
Boca!
o dom
possuis
de pores
louca
a minha boca!
Taça
de astros e flores,
na qual
esvoaça
meu ideal!
Taça cuja embriaguez
na via-láctea do Sonho ao céu conduz!
Que me enlouqueças mais… e, a mais e mais, me dês
o teu delírio… a tua chama… a tua luz…
Multifacetado, era considerado ao mesmo tempo parnasiano (ou neoparnasiano, segundo Otto Maria Carpeaux), simbolista e pré-modernista. Esse hibridismo estético o caracterizava. Também pudera, viveu num momento não só de grande efervescência cultural o Rio de Janeiro como também de mudança estética na literatura, proporcionada pela Semana de Arte Moderna de 22.
No Rio de Janeiro, conviveu com poetas de diferentes correntes e o ambiente de interlocução impregnou-o de diversas maneiras. A sua estreia, com o livro Apoteoses, projetou-o nacionalmente e chamou a atenção de João Ribeiro, Silvio Romero, Rocha Pombo e Olavo Bilac, só para citar alguns. “É Hermes-Fontes um moço, quase um menino, cujo livro Apoteoses é uma revelação de força lírica.”, disse Bilac, conforme menciona Assis Brasil em seu livro A poesia sergipana no século XX (1998).
Além de poeta, jornalista e cronista, era caricaturista e letrista. Suas caricaturas apareciam nos jornais O bibliógrafo, Tagarella e Brasil Moderno. Por meio dessa linguagem, satirizou a vacina obrigatória, a lei do Expurgo e o Código Civil. Também se posicionou em relação à Campanha Civilista em favor de Rui Barbosa e, posteriormente, da Revolução de 30. Quanto às suas composições ‘Luar de Paquetá’ e ‘À beira mar’, foram gravadas por Vicente Celestino e podem facilmente ser acessadas na internet.
Participou da organização da Academia Sergipana de letras e foi fundador da cadeira 16, cujo patrono foi Pedro de Calasans. Em seu Dicionário Biobibliográfico sergipano (1925), Armindo Guaraná nos informa que ele também foi membro correspondente da Academia Piauiense de Letras.
Um pouco do homem
A biografia de Hermes-Fontes é comovente. Nasceu em Boquim, região sul de Sergipe, em 1888. Aprendeu as primeiras letras em pouco tempo e foi levado para estudar em Aracaju aos 8 anos. Sua genialidade chamou a atenção de professores e figuras conhecidas, notícia que logo se espalhou pelo estado. De acordo com Ana Medina, em Cartas de Hermes Fontes: angústia e ternura (2006), “aos oito anos já era uma revelação, um prodígio de memória, lia jornais como se fosse um adulto e possuía grande talento para a música e o desenho”.
Tanto talento junto chamou a atenção do então presidente do Estado, Martinho Garcez, que o adotou, levando para o Rio de Janeiro com apenas 10 anos. Na capital federal, os estudos avançaram às expensas da família Garcez, mas tão logo pôde buscou a sua independência. Fez um concurso para os Correios, passando em primeiro lugar. Entrou na faculdade de Direito e foi morar numa pensão, onde conheceu Alice, o amor da sua vida, que representa um capítulo à parte na sua história.
O poeta perdeu a mãe nos primeiros anos da infância e foi arrancado do seio familiar muito jovem. Se a capital sergipana já era uma separação da cidade natal, imagine o Rio de Janeiro. Nas cartas dirigidas à família (com quem manteve longa correspondência epistolar), relatava a saudade da terra. Isso está demonstrado no livro Despertar! (1922), que ele dedica a “Sergipe, terra dos meu berço” e aos pais.
As cartas, que estão no Museu Raimundo Fernandes da Fonseca, em Boquim, revelam também que ele era arrimo de família. Sistematicamente, enviava quantias junto com as correspondências, em que sempre pedia notícias dos familiares, vizinhos e amigos.
Apesar de boa recepção crítica (publicou 11 livros em total) e de uma vida profissional intensa, Hermes-Fontes foi acumulando alguns dissabores ao longo da vida. Tentou entrar para a Academia Brasileira de Letras cinco vezes e, em todas elas, foi rechaçado. Também desejava ser Príncipe dos Poetas Brasileiros. No campo político, tentou ser deputado, mas não conseguiu.
Casou apaixonado, mas o sentimento não era correspondido à mesma altura. Sua mulher engravidou, mas perdeu a criança. Anos depois, soube que havia sido traído por ela e por pessoas próximas. Separaram-se, mas ainda nutria sentimentos por Alice. Além de tudo, tinha complexo de ‘físico acanhado’, pois media pouco mais de um metro e meio. Uma autorreferência à sua altura é o pseudônimo P.Q. Nino. Às vezes assinava com as iniciais H.F., ou F.H., invertidas. Leo-Zito, Leléo, Léo-Fábio, Rems, Rins e Roms também eram usados pelo poeta.
O poema ‘Esfinge’, cuja estrofe encabeça esta crônica, foi escrito por ele com o coração dilacerado. Era um homem romântico e, mesmo depois da separação, ainda se preocupava com o bem estar da sua amada, apesar de o coração dela ser um deserto, como diz o último verso.
Toda essa solidão, expressa na sua obra, culminou em uma profunda tristeza. Antes de suicidar-se com um tiro na cabeça, aos 42 anos, queixara-se com os amigos acerca do seu envolvimento na Revolução de 30. Mas diante da sua baixa autoestima e de tantas decepções, a amorosa sendo a pior de todas, tudo leva a crer na desilusão em relação à própria vida.
Cruzo diuturnamente a avenida Hermes Fontes, essa artéria sem a qual Aracaju não seria a mesma. Atravesso também as doze letras que compõem o seu nome e chego ao homem, esse poeta e gênio atormentado repleto de ternura.
---------------------------------
* Acácia Rios é jornalista, escritora, professora, mestra em Memória Social e Documental pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro e doutora em Ciências da Documentação pela Universidade Complutense de Madri. Leciona na Escola de Artes Valdice Teles.
Texto e imagens reproduzidos do site: www sosergipe com br
terça-feira, 25 de março de 2025
"Aracaju faz cem anos", por Maria Rita Soares de Andrade
terça-feira, 18 de março de 2025
A última lição do mestre José Abud
Legenda da foto: Doutor José Abud: com ele, morreu um pouco da humanidade - (Crédito da foto: reprodução com arte, de post no Facebook/Domingos Pascoal e postada pelo blog, para ilustrar o presente artigo).
Artigo compartilhado do site JLPOLÍTICA, de 17 de março de 2025
A última lição do mestre José Abud
Por Déborah Pimentel *
"Ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua própria produção ou a sua construção” (Paulo Freire).
Falar sobre o Dr. José Abud é revisitar um tempo de aprendizado intenso e exigente, uma época em que a propedêutica era ensinada com rigor e paixão por aqueles que compreendiam que a Medicina não era apenas técnica, mas também arte.
Para os que passaram por seus ensinamentos, ele não era apenas um professor. Era um mestre que exigia o máximo, pois sabia que o exercício da Medicina não permite superficialidades.
Fui sua aluna nos tempos de faculdade, na disciplina que molda a base de um médico: a Propedêutica. Aprendi com ele que examinar um paciente vai além de verificar sintomas e sinais físicos; é compreender a história que aquele corpo conta, a sutileza dos detalhes que fazem a diferença no diagnóstico e no cuidado.
Os anos passaram e quando fui presidente da Academia Sergipana de Medicina a vida nos proporcionou um reencontro. Dessa vez, não mais como professor e aluna, mas como colegas na Sociedade Brasileira dos Médicos Escritores, onde contribuímos juntos para todas as edições publicadas, em todas as antologias. Entre elas, recordo com carinho o lançamento da primeira antologia Vida, no Museu da Gente.
Naquela noite especial, meu conto Vida, Morte e o Morrer encontrou nele um dos seus leitores mais exigentes e generosos. A narrativa, que descrevia uma professora de Ética Médica recebendo de um ex-aluno - agora seu médico assistente - a notícia delicada de que estava com câncer, tocou profundamente Abud.
Como geriatra, ele conhecia o peso das más notícias e, ao final da leitura, disse-me algo que me emocionou profundamente: passaria a usar o passo a passo da comunicação descrito no conto como referência para lidar com seus próprios pacientes.
Receber aquele reconhecimento de um mestre tão rigoroso e exigente foi um dos momentos mais gratificantes da minha vida. José Abud e José Augusto Bezerra foram, sem dúvida, os professores que mais desafiaram minha geração.
Suas notas eram conquistadas com suor, esforço e dedicação. Eu nunca me considerei a mais brilhante da turma, mas sempre fui disciplinada e estudiosa.
Entre os professores que marcaram minha jornada, Abud, com seu jeito durão, sempre me elogiava - primeiro nos bancos escolares, depois como colega. Décadas depois, reencontrá-lo e vê-lo reconhecer em meu texto um ensinamento aplicável na prática médica foi um momento que uniu nossas trajetórias de uma maneira inesperada e profundamente emocionante.
Dr. José Abud não era apenas um mestre da propedêutica. Ele era um mestre da humanidade. Exigia perfeição porque sabia que a vida de um paciente depende da excelência técnica, mas também do acolhimento, da escuta, da presença sensível do médico. Sua memória permanecerá viva em todos aqueles que tiveram a honra de aprender com ele, dentro e fora da sala de aula.
Hoje, escrevendo este texto, celebro o legado de um professor que não apenas ensinou a examinar um paciente, mas também a enxergá-lo em sua totalidade.
A Medicina se despede de um grande mestre, mas sua essência permanecerá em cada um de nós que tivemos o privilégio de ser tocados por sua sabedoria e generosidade. Como médicos, como professores e como seres humanos, seguimos construindo, aprendendo e ensinando.
Afinal, como disse Paulo Freire, ensinar é criar possibilidades. E José Abud fez isso com maestria. Como sua aluna e colega, carrego suas lições e, agora, também como professora, desejo seguir seu exemplo, deixando meu próprio legado. Que meu ensino, assim como o dele, inspire, transforme e prepare não apenas médicos, mas seres humanos capazes de enxergar além do óbvio.
* Articulista Déborah Pimentel - É médica, pesquisadora da saúde mental e psicanalista.
Texto reproduzido do site: www jlpolitica com br