terça-feira, 1 de dezembro de 2020

'O Filho de D. Lourdes', por Lilian Rocha


Publicado originalmente no Facebook/Lilian Rocha, em 30 de novembro de 2020

O FILHO DE D. LOURDES
Por Lilian Rocha

Meu pai tinha uma grande admiração por ele. Dizia que ele era um homem de grande visão empreendedora. E ele, por meu pai. Não apenas uma admiração pelo homem culto que foi meu pai, mas nutria também uma gratidão profunda, por causa de uma gentileza que meu pai lhe fizera, lá pelos idos de 1977.

Sabendo que ele e a esposa estavam de viagem marcada para Madrid, meu pai pediu à minha irmã Suzana, que morava lá, para servir de cicerone ao casal. Prontamente, minha irmã concordou e só no dia seguinte, foi que ela soube que o tal casal era o então prefeito de Aracaju, João Alves Filho, e sua esposa, Maria do Carmo.

Mas não foi com “o prefeito” que ela passou o dia todo, pra cima e pra baixo, de táxi e de metrô, visitando praças, monumentos, fontes luminosas e galerias. Foi com o amigo de meu pai, homem simples, gentil e educado, que jamais esqueceu a atenção e a prestimosidade que recebera dela.

Só anos mais tarde, como assessora do secretário de Planejamento, foi que minha irmã teve a oportunidade de trabalhar para “o governador” João Alves e conhecer mais de perto “aquele homem perspicaz, que adorava ler, escrevia muito bem e tinha uma inteligência acima da média”, como ela mesma costuma dizer, ao se referir a ele.

Além de Dr. João, meu pai também tinha outra grande admiradora naquela família: D. Lourdes, a mãe dele. Ela era uma ouvinte assídua do programa “Rádio Revista”, que meu pai fazia na Rádio Cultura, não perdia um. E normalmente ligava para ele ao final do programa, para cumprimentá-lo. Com isso, meu pai também passou a ser muito grato a Dr. João, pelo carinho genuíno que sua mãe lhe dedicava, sem ao menos conhecê-lo.

Essa mistura de ‘admiração e gratidão’ de ambos foi crescendo ao longo dos anos e se estendendo por toda a nossa família. Lá em casa, João Alves era unanimidade.

Mas João Alves entrou na minha vida indiretamente, através de sua irmã Marlene. Nós nos conhecemos na Escola Normal, quando éramos professoras da mesma disciplina, e a partir dali, nos tornamos amigas e parceiras de trabalho. Graças à Marlene, me tornei professora de português e também radialista, como meu pai. Passei a ter por ela não só uma grande admiração, mas também uma profunda gratidão, que foi se estendendo ao longo dos anos. 

Marlene também era uma fã incondicional de meu pai e assim que se tornou superintendente da Fundação Aperipê, convidou-o para fazer um programa de rádio lá.

Certo dia, quando João Alves estava governando o estado pela segunda vez e nós estávamos trabalhando juntas na Aperipê, Marlene me levou para conhecer sua mãe, D. Lourdes.

Conhecer a mãe de alguém é o mesmo que entrar na intimidade daquela pessoa. É conhecer suas origens, entender o que está por trás de tudo, ver de perto a árvore que gerou aquele fruto.

D. Lourdes era uma senhorinha gentil e simpática que vivia sorrindo. Sempre muito discreta, era feliz na sua simplicidade e avessa a qualquer tipo de exibição e holofotes. Nem parecia ‘a mãe do governador’. Porque no coração dela, João era apenas João, seu filho. Ele não precisava ser prefeito nem governador para ela sentir orgulho. Ser seu filho já lhe bastava.

Foi essa simplicidade dela que me cativou logo de cara e me fez entender por que meu pai também lhe queria tanto bem.

Poucos meses depois que a conheci, ela se foi. E eu passei toda aquela madrugada triste ao lado de Marlene. Foi uma dor que também doeu em mim e, no dia seguinte, ainda emocionada, acabei escrevendo um texto sobre D. Lourdes que posteriormente li no meu programa de rádio.

Na missa de sétimo dia, Marlene pediu emprestado esse texto e o leu na igreja. Ao final da missa, aquela fila interminável para os cumprimentos. E como era uma missa pela mãe do governador, a fila tinha três vezes mais gente do que comumente teria...

Quando estava quase chegando a minha vez de cumprimentar a família, comecei a ficar nervosa. Eu iria falar pessoalmente com ninguém mais, ninguém menos, que João Alves, o governador do Estado! Seria a primeira vez que eu estaria tão próxima de um chefe de estado!

Mas não foi a mão do governador que eu apertei naquele dia. Nem do prefeito, nem do político nem do engenheiro. Foi de um filho sofrido que havia perdido a mãe.

E de súbito, ele olhou pra mim e com os olhos cheios d´água, me disse: “Foi muito bonito o que você escreveu pra minha mãe. Muito obrigado!”

Eu nunca conheci pessoalmente o João Alves de quem todos falavam. O João Alves da Coroa do Meio, o João Alves da Orla, o João Alves da ponte. Mas por alguns segundos, estive frente a frente com o filho de D. Lourdes, doce e gentil como ela, que não conseguia esconder a emoção por ter que dar adeus a ela.

Poucos são aqueles que conseguem passar pela vida deixando uma marca. Mas por onde quer que olhemos hoje, vamos ver as inúmeras marcas deixadas por João Alves em Aracaju.

Despeço-me, portanto, do amigo de meu pai e de minha irmã, do filho querido de D. Lourdes, do irmão e companheiro de Marlene e daquele homem simples, que me apertou a mão e me agradeceu.

Foi muito bonito ver o estado todo lhe prestando homenagens, sinal de que ele realmente foi um grande estadista.

Mas foi muito mais bonito sentir que aquele grande político, capaz de tão grandes feitos e o filho de D. Lourdes, doce e gentil como ela, eram a mesma pessoa...

Texto e imagem reproduzidos do Facebook/Lilian Rocha

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