segunda-feira, 20 de maio de 2024

Artur Oscar de Oliveira Déda, pensamento e ação


Legenda da foto: Artur Oscar de Oliveira Déda (1932 -2018)

Publicação compartilhada do site DESTAQUE NOTÍCIAS, de 19 de maio de 2024

Artur Oscar de Oliveira Déda, pensamento e ação
 Por Gilfrancisco Santos*

O novo código não é uma obra perfeita. E como toda construção legislativa importante, tem recebido muitas críticas. Não poderia ser diferente. Assim também aconteceu com o velho estatuto, ainda em vigor. Quando ele surgiu, em 1916 alguns diziam que era obra muito avançada para o seu tempo. Outros, ao contrário que ele já nascia velho, em descompasso com a realidade. O certo é que em vista da amplitude da matéria e sua relevância o novo código não poderia colher o aplauso da unanimidade. As críticas mais severas dirigem-se principalmente à construção do Direito de Família.

Filho de José de Carvalho Déda e Maria Acioli Déda, nasceu em Simão Dias (SE) a 2 de março de 1932. Cursou o ginásio no Colégio 2 de Julho (BA) até 1950 e o colegial no Colégio Estadual de Sergipe e no Colégio Central da Bahia. Graduado em Ciências Jurídicas pela Faculdade de Direito de Sergipe, entre (1954-1958), em 1974 fez curso de pós-graduação na mesma instituição de ensino, com especialização em Direito Público e Direito Privado, da qual foi professor da disciplina Direito Civil.

Artur Oscar de Oliveira Déda trabalhou como 3º Oficial de Secretaria da Assembleia Legislativa de Sergipe no ano de 1955, assumindo depois o cargo de chefe dos Anais da Secretaria da mesma Assembleia. Foi Promotor Público substituto na Comarca de Aquidabã, no anos de 1958, e Juiz de Direito das Comarcas de Riachão do Dantas em 1961, Maruim, 1964, Estância, 1968 e, finalmente, da 3ª Vara Cível da Comarca de Aracaju. Em maio de 1975 foi promovido para o Tribunal de Justiça, onde exerceu os cargos de Corregedor Geral (1977-1979), Presidente (1979-1981) e Vice-Presidente. Foi também Presidente do TRE-SE.

Artur Oscar iniciou-se no magistério jurídico em 1969, aposentando-se voluntariamente em 1992, ano em que recebe o título de Professor Emérito pela UFS. Em 11 de agosto de 1982 tomou posse na Cadeira nº 28 da Academia Sergipana de Letras, tendo como fundador o Desembargador Gervásio de Carvalho Prata (1886-1968), sendo saudado pelo acadêmico Luiz Carlos Fontes de Alencar (1933-2016). Em 20 de fevereiro de 2002 aposentou-se do cargo de Desembargador do Tribunal de Justiça de Sergipe, permanecendo, porém, com a sua atividade cultural na produção de textos, artigos e ensaios em revistas jurídicas e especializadas. Dentre os livros jurídicos publicados figuram: “Questões de Direito Público e Privado” (1992); “A Reparação dos Danos Morais” (2000); “Alienação Fiduciária em Garantia” (2000); “A Prova no Processo Civil” (2006).

Discurso de Recepção na ASL

Recebido na Academia Sergipana de Letras pelo acadêmico Luiz Carlos Fontes de Alencar, em sessão solene realizada no dia 11 de agosto de 1982, no Auditório Governador José Rollemberg Leite, do Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe. Artur escreveu outros livros de ficção e crônicas: “História de vários tempos” (2014); “Aconteceu em Santanápolis” (2015) e o romance “Intramuros do Poder” (2017).

Sobre Histórias de Vários Tempos

Desembargador aposentado de alta e meritória atuação na magistratura sergipana, o autor é um velho formador de jovens, professor de várias gerações de advogados, desde a antiga Faculdade de Direito de Sergipe, a vetusta escola da Rua da Frente.

Poder-se-á dizer ainda que o autor é um simão-diense (ou anapolitano, por longa briga), filho do jornalista, escritor, político eloquente e folclorista luminoso, José de Carvalho Deda, autor de Brefaias e Burundangas (folclore sergipano), Formigas de Asas (romance), Simão Dias, Fragmentos de sua história (onde há três Simão Dias e só um deles verdadeiro), e sua senhora Dona Maria Oliveira Deda.

Ainda se poderá dizer que seu nome, Artur Oscar, e de um seu irmão, Carlos Eugênio, lembram passagem da Guerra de Canudos, de generais que pisaram o solo de Senhora Santana no combate à “Guarda Católica”, do hoje santificado Bom Jesus Conselheiro.

Parando com a biografia do autor, antes tenho a declarar, que lhe tenho profunda admiração e ao seu irmão, o advogado Beto Deda, espécie de Cavaleiro Templário, fiel guardião zelador dos arquivos de “A Semana”, jornal simão-diense que precisa ser digitalizado para constituir arquivo de nossa história.

Mas, em “História de Vários Tempos”, é difícil sublinhar o melhor texto entre os oitenta listados por Artur Deda, Como não achar delicioso o texto “Sobre milagres”? Como não ficar feliz em sendo um torcedor derrotado do Club Sportivo Sergipe, saindo cabisbaixo e tristonho do estádio, em choro gerundial compulsivo, e ver que um milagre acontecera, e do pranto surgira o riso com o entorno universal alvirrubro, em euforia arrebentando: “… O pendão alvirrubro a vibrar…”, em pleno fervor como nem o poeta Freire Ribeiro o imaginaria em Troféus e archotes, e no próprio hino do “Bravo clube dos filhos do Norte”?

Que dizer das visitas à Cruz de Bela, e à santinha do Maruim, e do milagre realizado pelo autor “mordido pelo sentimentalismo pequeno burguês”, no dizer de seu mestre Orlando Gomes, e sendo santo, terno e bom, tão milagreiro, quão taumaturgo, igual ao monge menor de Voltaire, exercendo milagraria em terra estranha, em São Paulo, na desvairada Paulicéia, até para confirmar e reafirmar, que é bem mais fácil ser profeta em terra alheia? Como esquecer também da folheira convocação para se comprovar vivo, comezinho e corriqueiro chamamento, de obrigação anual do indivíduo aposentado, peregrinando por repartições, onde não valem o verso e o canto de Roberto Carlos; “Eu existo!… eu existo!… eu existo!…”?  Mas, que é preciso provar, estar vivo “sob as penas da lei”?  E que dizer da labiríntica procura por salas e corredores, como Teseu sem Ariadne e seu fio, na busca a fio do inexistente Departamento de Recursos Humanos, morto e enterrado sem lápide, só porque nas repartições públicas “existe a prática de abreviar tudo, inclusive os direitos e deveres?” Genial! Não?

Odilon Cabral Machado – Jornal do Dia

Eu sou suspeito para falar de um tio, de um irmão de minha mãe. Mas acredito que o estado de Sergipe conhece o talento, o valor intelectual, a trajetória profissional do cidadão Artur Oscar de Oliveira Déda. Para nossa família ele sempre foi uma referência; de cultura, estudo, seriedade, ética, respeito à sociedade, amor pelo estado e dedicação do Brasil. Durante sua vida, como juiz, construiu uma referência, que até hoje é lembrada em toda comunidade jurídica. Agora, na sua aposentadoria, deixou fluir, ainda mais o seu lado intelectual, produzindo crônicas que relatam, não apenas a sua memória, mais também, as suas observações sobre a atualidade.

Marcelo Déda – Governador, IMD, 2012

Homenagem Póstuma

O Desembargado Artur Oscar de Oliveira Déda faleceu na noite de 29 de junho de 2018, aos 86 anos. Estava internado por insuficiência hepática e não resistiu, deixando esposa, Maria Estrela de Aguiar Déda, quatro filhos, sete netos, um bisneto. O sepultamento foi realizado no cemitério Colina da Saudade, em Aracaju.

Com o artigo “Artur Déda, um mestre honrado e de alma generosa na magistratura”, a Revista Judiciarium, TJSE, julho de 2018, presta uma significativa homenagem ao Desembargador Artur Osório de Oliveira Déda:

Eu estava em viagem a São Paulo quando fui informado do falecimento do Desembargador Artur Oscar de Oliveira Déda. Realmente, foi uma notícia que me abalou, mesmo sabendo que a saúde do velho mestre já vinha bastante deteriorada nos últimos tempos.

Muito tem se falado sobre o Desembargador Artur Déda nesses últimos dias e decerto se fala ainda mais. Porém, vieram à tona lembranças do professor, como eu gostava de chama-lo, que para mim são marcantes. Todo profissional sofre a influência de noutros tantos com quem conviveu, e comigo não foi diferente.

Tenho em mim um pouco de vários magistrados com os quais convivi ao longo desses anos de profissão e posso dizer que o professor Déda, dentre os que me influenciaram, foi o meu modelo de magistrado. Seu porte, do aspecto intelectual, à forma de se conduzir no exercício das diversas facetas profissionais, sempre me encantaram.

Tive oportunidade de ser examinado pelo professor Artur Déda durante o meu concurso para ingresso na magistratura e lembro como ele nos fazia sentir à vontade durante a prova oral. Paciente, acolhedor, justo na atribuição das notas.

No exercício da magistratura na segunda instância, era magistral em seus votos ne, como decano, impunha um respeito natural aos seus pares, que se podia sentir no ar quando ele usava da palavra.

Nós, que atuamos em órgão Colegiado, sabemos o quão difícil é se fazer ouvir e levar à reflexão os colegas durante uma discussão jurídica. Ele o fazia com uma naturalidade ímpar. Generoso com os colegas menos experientes, essa era uma das suas marcas.

Eu, particularmente, lembro de que certa feita substitui ao Desembargador Aloisio Abreu (outra grande figura) no ano de 1998 e me vi em apuros, quando em uma sessão da Câmara Civil dois membros me questionavam sobre aspectos do meu voto.

O Desembargador Artur Déda saiu em meu socorro e, com aquele ar tranquilo e professoral, fez uma intervenção dizendo que eu, em verdade, estava discorrendo sobre pontos que ele, sim, expôs brilhantemente, tirando-me daquele sufoco em que um substituto às vezes fica – Só almas generosas são capazes de gestos como aquele.

Elegante no trajar, no porte digno de um ministro de Corte Superior, o professor Artur Déda era dono de um senso de humor britânico, para não falar do seu dom peculiar de bom contador de histórias que acumulou ao longo de uma vida rica de episódios profissionais e pessoais enriquecedores para os seus interlocutores.

Aliás, isso se pode constatar em suas obras ne artigos semanais no Jornal da Cidade, onde discorria com uma leveza e elegância de fazerem igualar aos melhores cronistas do Brasil.

Poderia aqui falar muito mais sobre o meu eterno professor Artur Oscar de Oliveira Déda, mas não seria justo para com outros que poderão melhor descrevê-lo do que este pobre discípulo. Despeço-me, assim, do velho mestre, agradecendo o exemplo de exercício de magistratura e de honradez que trago comigo no mister desta profissão tão bela e tão difícil.

Cezário Siqueira Neto, Presidente do Tribunal de Justiça de Sergipe (2017-2019)

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*Gilfrancisco é jornalista, escritor, Doutor Honoris Causa concedido pela UFS. Membro do Grupo Plena/CNPq/UFS e do GPCIR/CNPq/UFS gilfrancisco.santos@gmail.com

Texto e imagens reproduzidos do site: www destaquenoticias com br

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