quarta-feira, 15 de março de 2023

Sobre: Histórias do meu Pai & Estórias por meu Pai

 Família Barreto - noite de lançamento do livro 


Legenda da foto: Dona Joselita Barreto comemorando seus 102 anos

Texto publicado originalmente no blog da ACADEMIA LITERÁRIA DE VIDA, em 25 de julho de 2022 

Sobre: HISTÓRIAS DO MEU PAI & ESTÓRIAS POR MEU PAI

Por Shirley Rocha

Li de um lance as cento e vinte e três páginas do livro de Lena Barreto, HISTÓRIAS DO MEU PAI & ESTÓRIAS POR MEU PAI, uma coletânea organizada de escritos do seu pai, o senhor Paulo Barreto Mesquita, irmão e um dos herdeiros do senhor Juca Barreto, o fundador do Cine Teatro Rio Branco.

O Cine Rio Branco foi uma casa de espetáculos que funcionou desde a década de 1920, no segundo trecho da Rua João Pessoa 182 (hoje José do Prado Franco), centro da cidade de Aracaju. Gerações assistiram inúmeros espetáculos ali. O palco era ornado por uma cortina de veludo vermelho escuro e após outra de tecido voal sedoso e branco, ao fundo a tela apropriada para o cinemaScope (técnica que aumentava consideravelmente a projeção na tela) e com uma acústica primorosa; serviu para apresentações de grandes estrelas do teatro, música, nacional e internacional. Findo a era do cinema, o prédio foi se desfigurando e hoje, no local, funcionam várias lojas de roupa.

Paulo Barreto Mesquita era um senhor admirador das artes e da literatura. Lena Barreto (Maria Magdalena Barreto) número sete na prole é conhecida por seu talento ao contar estórias. Com aquela curiosidade de criança, observando o dia a dia da família, a atitude do pai, foi com uma lupa escolhendo, buscando na memória, palavras e fatos, desde o chefe de família ao literato, com dons para escrever peças de teatro, crônicas e mensagens aos parentes e amigos nas ocasiões festivas.

O estilo de Lena é simples, direto, claro. Captou das gavetas do seu pai alguns escritos, alinhavou depoimentos dos outros irmãos e contou uma estória cativante talvez pelo temperamento do senhor Paulo e a forma como ele encarava a vida. A esposa do senhor Paulo, senhora Joselita (Josefa Batista Barreto) e as estórias da vida do casal, refletem a verdadeira riqueza de uma família unida pela educação e amor comprovados pelos mais de 50 anos de vida conjugal.

Seu Paulo Barreto faleceu aos 79 anos, em 1990. Mas Lena Barreto após uma força tarefa deixou para o mundo, principalmente aos sergipanos, um pouco do que foi aquele homem sempre bem arrumado, cabelo impecavelmente penteado e atencioso com todos que chegassem perto. Não conhecia sobre o lado intelectual dele, a delicadeza nos versos, o sentimento terno em suas crônicas, e que escreveu peças de teatro... Não sabia da irreverência dele! Ele e dona Joselita formavam um par espetacular. Valeu Lena, dei boas risadas!

Os guardados de Lena, Cândida, Cleandro, Cássio, Carlinhos, Cleia, Ricardo, Roberto e Maria Viana trouxeram à luz um sergipano que promoveu as artes do teatro, música e do cinema na sua terra. As crônicas e poesias estão no livro que também registram fotos. Vale à pena ler.

Como é tempo de São João vou transcrever uma poesia, que entre outras, consta do livro:

TIÃO

Por Paulo Barreto Mesquita

Quando ela disse a Tião

Qui entre os dois nada inxistia

Naquela noite tão fria

Da vespa de São João

Tião ficou diferente,

Num quis mais falá cum a gente

8

Não pulou mais na fugueira,

Pru mode se batisá,

Cumo tinha prometido

À muié de Zé Cumprido

 8

Não insperou pelo mio

Qui já cheirava nas brasa.

Tião só quis ir pra casa.

8

Pra que sambá

Pra que nada

Pra que fazer mais besteira

Se seu coração ferido

Tava pio qui a fugueira

Qui estalava na madeira

Cumo instalo de pipoca

Que se torra in caco novo

Pra mode vendê na fera

8

Mais qui bicho sem vergonha

É o coração de muié

Pega um home de arrespeito

Que veve do seu trabaio

Pra fazer dele o que quer

8

E adispois qui a gente pensa

Qui a peste gosta da gente

Ela na cara desmente.

Home, só mesmo sendo muié

Pruque se ela fosse home

Eu juro pru S. João,

Não cumia mais feijão.

8

Já vinha raiando o dia

Mas ao longe ainda se ouvia

O samba de Zé Cumprido

Onde a mardita sambava

Sem se alembrá que distante

Um coração de caboclo

De sodade se acabava.

Gostaria de concluir com algumas palavras escritas pelo filho Cleandro Barreto na contra capa do livro, referindo-se ao seu pai:

“Fim do 3º Ato

Fecham-se as cortinas e apagam-se as luzes da ribalta, no palco da vida, no teatro do tempo, que teve sua última função no principal papel, um Amigo das Estrelas. Poeta talentoso, escritor, jornalista, membro da ASI, teatrólogo amante e incentivador da cultura, pai bondoso, extremoso marido, atuante defensor dos menos favorecidos. Sua passagem pela vida foi de amor, sonho e bondade...”

Este ano a senhora Joselita completou 102 anos (....). Ganhou uma festa dos filhos e parentes. Seu Paulo deve estar dizendo aos anjos: Ela me passou a perna...

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Shirley Rocha

Aju/06/22

Jornalista e Presidente da Academia Literária de Vida.

Texto e imagens reproduzidos do blog: academialiterariadevida.blogspot.com

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