Artigo compartilhado do site RITA OLIVEIRA ACONTECE, de 14 de dezembro de 2025
José Augusto Sergipano: A Canção que Nasceu em Sergipe e Ecoou no País
Por Emanuel Rocha*
O Ídolo Romântico de Sergipe que Imortalizou a Saudade em Canções
No dia 3 de outubro de 1936, as primeiras luzes suaves tocavam com delicadeza as casas humildes da Avenida Santa Terezinha, no bairro da Baixinha, em Aquidabã, Sergipe. Nesse cenário de simplicidade, nasceu José Augusto Costa, um menino que desde cedo revelou uma força interior capaz de transformar sonhos em melodias. Crescendo entre ladeiras transmitidas de histórias antigas e o pulsar diário de Aracaju, uma cidade que abraçou sua infância, José Augusto bebeu das fontes da cultura nordestina e do cotidiano sergipano, alimentando-se de suas ricas tradições e filhos variados.
Desde menino, a música não era apenas som, era companhia íntima que se insinuava nas festas populares, brilhava nos programas de rádio e encantava os bailes que faziam a cidade respirar alegria. Sua voz, terna e forte ao mesmo tempo, parecia abrir um caminho direto para o coração sergipano, coletando emoções como quem pesca estrelas na maré da madrugada. Assim, com esse dom que nasceu dele como nasceu o sol naquela manhã de outubro, as portas do destino se abriram, convidando-o a seguir os trilhos pelos luminosos da própria história.
Em Aracaju, onde ainda pulsava a lembrança do menino que soltava sua voz entre os ônibus da linha Marinete do Chico, o sonho de romper fronteiras começava a germinar como semente teimosa buscando o sol. Trazendo no peito a coragem dos que respiram esperança, ele partiu em 1963, aos 27 anos, para São Paulo, cidade imensa que parecia inalcançável, porém pronto para reconhecer a força de um talento que nasce do coração do Nordeste.
Naquele universo de luzes apressadas, entre noites em palcos modestos e dias de trabalho rigoroso, sua determinação ressoava como quem insistia em fazer a vida florescer mesmo em terrenos duros. Foi nesse compasso que a gravadora Chantecler estendeu a mão decisiva, e sua canção “Minha Mãezinha” rompeu o silêncio da cena musical brasileira, espalhando uma melodia doce e emocional que conquistou o país e revelou o intérprete romântico que nasceu para encantar multidões.
O que veio depois foi um rastro luminoso de conquistas, com mais de 200 canções e 22 LPs navegando por mares de emoção e ternura. Álbum após álbum, de Florisbela Saint-Tropez / Saudade Bateu Na Porta (1961) a Valor de um Coração (1976), José Augusto entregou ao mundo uma voz capaz de tocar o que há de mais simples e profundo na alma brasileira. Entre seus grandes sucessos, “Beijo Gelado” emocionava com versos que traduziam a dor do amor não correspondido: “Tenho um beijo gelado que ninguém quis beijar…”, uma imagem poderosa que capturou a essência de sua interpretação sensível e verdadeira.
Suas canções não falavam apenas de amor, mas também das dores que nos visitam, das alegrias que nos elevam e dos sentimentos que fazem a existência vibrar. Por isso, sua arte se tornou ponte entre o íntimo e o universal, entre o que cada pessoa guarda para si e o que todos reconhecem como verdade do coração. Assim, suas melodias percorreram calçadas de Aracaju, avenidas das grandes cidades e até fronteiras distantes, chegando aos cantos da América Latina onde sua voz encontrou novos abraços e afetos.
A relação de José Augusto com Aracaju não foi mera circunstância, mas capítulo decisivo de sua formação artística, lugar onde sua voz ganhou corpo e horizonte. Embora não fosse filho legítimo da cidade, encontrou ali um chão afetivo que o acolheu e o impulsionou, fazendo naquela paisagem litorânea uma espécie de lar escolhido para tecer seus sonhos. Como alguém que leva consigo cada rua que o viu crescer, seu legado entrelaça-se à memória sergipana, continuando a iluminar a cultura do estado. Esse vínculo ganhou reconhecimento público em 2024, quando a Assembleia Legislativa de Sergipe declarou sua obra Bem de Interesse Cultural, gesto que reafirma o valor de sua música e a marca profunda que deixou na história regional.
Nos estudos contemporâneos, sua trajetória é pensada como um pacto luminoso entre cultura popular e memória coletiva, onde a magia das antigas rádios e televisões dos anos dourados dialoga hoje com o pulsar das redes sociais, preservando sua presença e mantendo viva a chama de sua arte. Sua trajetória como artista negro, moldado entre as ladeiras de Sergipe e os palcos do país, acrescenta novas camadas a essa história, revelando um intérprete que não apenas cantou sentimentos, mas traduziu pertencimentos, lutas e afetos coletivos. Assim, José Augusto se torna figura de múltiplas faces, símbolo de expressão cultural que caminha em comunhão com o canto da alma sergipana, ecoando como herança viva no imaginário do país.
A vida, porém, lhe pregou uma peça cruel. Aos 45 anos, em 5 de dezembro de 1981, um trágico acidente abafou sua voz física, mas nunca apagou o brilho infinito de sua obra, que segue viva, pulsante, ecoando nas histórias, nas vozes e nos corações de quem o ouve. José Augusto Sergipano não foi apenas um cantor; foi um poeta do amor, um intérprete da saudade e um filho eterno de Aracaju, cuja música ressoa como uma canção sem fim no tempo.
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* Emanuel Rocha é Historiador, poeta popular, escritor e Repórter fotográfico.
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Texto reproduzido do site: roacontece com br

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