sexta-feira, 27 de novembro de 2020

'João Alves, uma página da história de Sergipe', por Luiz Eduardo Costa


Publicado originalmente no site F5 NEWS, em 26 de novembro de 2020

Blogs e Colunas - Luiz Eduardo Costa - 26/11/2020
TEXTOS ANTIVIRAIS (38)
JOÃO ALVES E O MAPA DE SERGIPE
(João Alves, uma página da história de Sergipe)

O fato aconteceu na campanha de João Alves, quando ele tornou-se prefeito eleito de Aracaju. Antes, quando surgiu o engenheiro realizador, ele fora nomeado pelo governador José Rolemberg Leite. Naquela campanha, João mal acabara de concluir o seu terceiro mandato de governador, tendo, num interregno, sido Ministro do Interior por quatro anos, do presidente José Sarney.

Seus marqueteiros buscavam demonstrar a capacidade realizadora de João, e mostraram, na televisão , um mapa da cidade de Aracaju. Como num jogo de armar figurinhas, foram retirando pedaços da cidade. No mapa, restaram grande manchas brancas.

E eles então foram explicando o que era cada peça retirada do espaço contendo a cidade, e revelando o que significavam aquelas peças.

Sem dúvidas, a cidade ficou mutilada de forma impressionante. Sumiram a Orla da Atalaia, a Coroa do Meio, o Parque do Morro do Urubu, a Orla José Sarney, as pontes, Aracaju-Barra; do rio do Sal, do rio Poxim; diversas avenidas, praças, postos de saúde, conjuntos habitacionais, ginásios; o Teatro Tobias Barreto, o Centro de Criatividade, o Hospital de Urgência; este, agora, por decreto do governador Belivaldo, voltando a ser chamado Hospital João Alves. O nome foi retirado por determinação do MP em obediência à lei que proíbe a denominação de pessoas vivas aos locais públicos.

João Alves agora está morto, assim, é tempo para que se relembre o significado completo dele num mapa mais extenso, o de Sergipe.

O que ele conseguiu fazer salta à vista, é, de fato, impressionante.

Quando João assumiu o seu primeiro mandato eletivo em 1983, chegou, com ele, uma ousada ideia de desenvolvimento. No pequeno Sergipe, desprovido de recursos, de influência política, pensar em grandes empreendimentos tocados pelo próprio estado, seria juízo de menos, ou demagogia demais.

Tantos outros governadores antes tiveram ousadias imensas, mas João, em três mandatos, acumulou uma soma de realizações portentosas.

João chegou ao governo com uma ideia fixa, que ele já havia maturado em estudos alongados, e em viagens pelo mundo, onde fazia suas observações e recolhia experiências.

Na cabeça de João Alves vivia a crepitar constantemente uma espécie de fogo inquietador de ideias que se amontoavam, e era preciso formatá-las, dando-lhe a forma de projetos viáveis, e, sobretudo, escorados numa viabilidade financeira que teria de ser conseguida.

Ou seja, tudo era mesmo uma ilimitada ousadia.

Havia uma dose do quase desatino, naquela esperança que as vezes atropelava a precaução e o bom senso.

João Alves agia em duas frentes. Na execução dos projetos, e na articulação política, para assegurar os incertos cruzeiros que a inflação ia corroendo, entre a noite e o dia. Isso gerava uma operação que se chamava “over night”, as aplicações a curtíssimo prazo resultando em ganhos absurdos, o que desnudava a fragilidade de uma base financeira em frangalhos, desencorajando investimentos, e afastando do cenário econômico qualquer vestígio de previsibilidade.

Foi nesse clima que João ousou alavancar em Sergipe, grandes investimentos públicos.

Tinha, ao seu lado, os dois encarregados da engenharia de ferro e cimento; e da outra, igualmente complexa: a engenharia com as fontes de recursos. Eram eles, o engenheiro Jose Carlos Machado, e o economista Antônio Carlos Borges.

Assim, nesse clima de total insegurança atravessou seu primeiro mandato, (1983 – 1987) e o segundo, já em parte afetado pelo Plano Real, ( 1991 – 1995).

Foi num clima conturbado como esse, que João Alves conseguiu construir em Sergipe quatro grandes perímetros irrigados de grande porte. Sua obra portentosa não se resume nisso, mas será possível sintetizar nelas, a criatividade e o arrojo.

O Califórnia, uma obra desafiadora no semiárido, nas lonjuras ainda despovoadas de Canindé do São Francisco. Houve a captação da água no São Francisco, a adução a uma altura de 170 metros, o sistema de bombas potentes, a adutora, o labirinto de canais.

O Califórnia abriu passagem para que João recebesse o apelido de “João da Agua,” e penetrasse pela aridez sertaneja, concretizando a esperança da água, e viabilizando a produção.

Depois, veio o Jabeberí, armazenando água numa calha enorme entre serranias, e possibilitando a irrigação; fazendo a vocação comercial de Tobias Barreto se revelar também na pecuária leiteira, na agricultura.

O Platô de Neópolis, é o maior de todos, desfazendo a ideia passadista de que em terra ruim não se consegue produzir. Mais uma vez, retirando a água do São Francisco, bem mais perto da foz, onde agora já existe a ameaça de salinização. Esse avanço do mar sobre o Rio Doce, está a exigir a montagem de um sistema de proteção do baixo São Francisco, talvez, uma gigante barragem de foz. Mas isso já é uma outra história, e que nem pode ser sonhada agora, quando, gerada no governo central, se espalha pelo país uma outra pandemia de incertezas.

Finalmente, os lagos imensos e as barragens enormes, fazendo agregar ao dinamismo econômico de Lagarto, e Itabaiana, mais dois instrumentos de desenvolvimento. O perímetro irrigado Dionísio Machado, e o Jacarecica -1

Esses cinco perímetros, resultam de uma ação impressionante de rápida coleta de dados e informações, em locais de difícil acesso, como então era Canindé do São Francisco, e com um precário conhecimento da estrutura e composição dos nossos solos. Como se definiram os locais, como se estudaram tão rapidamente os solos, como se processaram as obras em condições tão adversas? Isso é algo que só faz aflorar a visão de João Alves, e a sua incomum ousadia criativa.

Toda essa história ainda está para ser devassada e contada.

Nela, será instigante buscar aferir a dimensão de Maria do Carmo Alves, naquele tempo em que João andava a fazer essas coisas assim, quase impossíveis.

Jose Carlos Machado poderia fazer um cálculo. Sairia juntando a superfície dos perímetros, de todas as obras de João, para depois revelar no nosso mapa, qual a proporção delas. É possível que, juntas, ultrapassem os mil quilômetros quadrados.

É bom lembrar que Sergipe só tem vinte e dois mil quilômetros quadrados de superfície.

Texto e imagem reproduzidos do site: f5news.com.br

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