Texto publicado originalmente no Facebook/Clara Angelica Porto
João, você foi o maior de todos
Por Clara Angélica Porto
Brasilia, a 70 km. Em um carro em velocidade (estávamos
atrasados), seguimos para a emissora de televisão onde o Ministro estava sendo
aguardado para gravar uma entrevista. Com o gravador ligado, eu e João Alves
Filho começamos a nossa entrevista para o jornal O Que. Eu sempre ficava
impressionada com a rapidez e clareza de raciocínio daquele homem.
Chegamos à televisão e desliguei o gravador. Continuaríamos
depois. Ao chegarmos ao estúdio da TV, percebi que dr. João estava suado.
Precisava preparar-se para ir ao ar. Falei com alguém e me disseram que havia
uma sala de maquiagem, mas o maquiador não estava. Convidei dr. João a ir
comigo. Refresquei-lhe a pele com uma loção, passei um pouco de base sem brilho
e ele ficou ótimo, pronto para a entrevista. Brilhou! Aliás, não era nenhuma
novidade. João Alves não era somente um grande empreendedor, o maior político
de Sergipe, o maior governador do estado, ele era um dos homens mais brilhantes
que já conheci.
“O mundo é feito pelos que sonham”, disse-me em entrevista.
“Sou um mestre de obras que sonha grande”, disse-me também.
Foram muitas as entrevistas, foram muitos os momentos de
conversa descontraída, que sempre me deixavam admirada pela inteligência
cognitiva e emocional daquele homem.
Ele nunca perdia o fio da meada. Certa vez, quando me recebia em sua residência,
começamos a conversar de gravador ligado. Minutos depois, alguém entrou e
lembrou-lhe que tinha que ir a um enterro. Olhou para mim e me pediu que
ficasse e esperasse por ele. Colocou um vídeo de um balé russo e disse: “É
lindo, vejo sempre. Antes que acabe estarei de volta”. E, virando-se para o
emissário: “Mande trazer doce de araçá”. Era o doce preferido de João Alves.
Fiquei ali, encantada com o vídeo, confortavelmente instalada no sofá, comendo
doce. Uma hora depois ele voltava, e quando eu ia ligar o gravador para ele
ouvir as últimas frases, ele sorriu aquele sorriso enorme e disse: “Não
precisa. Sei exatamente onde fiquei”. E continuou o pensamento como se não
houvesse sido interrompido.
Mente ágil, coração brando e sensível, olho de águia, ele
percebia todas as coisas de imediato e sabia como poucos lidar com as
circunstâncias. Para ele, crises eram oportunidades e citava o significado de
crise em chinês.
Um dia, minha ajudante foi atender o telefone e voltou com
os olhos arregalados: “D. Clara, acho que é trote. Tem um homem dizendo que é o
governador João Alves Filho”. E era. Estava mandando um carro para eu ir tomar
o café da manhã com ele. “Venha comer cuscus com ovos comigo, preciso falar com
você”.
Sempre tínhamos conversas intermináveis que eu acabava
transformando em artigos ou análises. A inteligência de dr. João me fascinava.
Tínhamos uma admiração mútua e daqueles olhos sempre sorridentes, recebi muita
aprovação.
João Alves acreditava em mim. Fomos mais que a jornalista e
a autoridade, fomos amigos. Eu o adorava e não fazia segredo disso. Era grande
a minha admiração por aquele homem que sonhava grande e realizava. O maior
empreendedor público de Sergipe. Sergipe é um antes e depois de João Alves.
Aracaju também. Por onde ele passava,
virava canteiros de obras enormes que iriam mudar a economia, gerar empregos,
mudar a aparência. Fotos de Aracaju antes de João e depois de João, mostram o
impacto das mudanças.
João Alves era um homem bom. Disse-me que mesmo em meio a
campanhas, quando chegava em casa de madrugada, rezava o terço ajoelhado antes
de dormir. Podia estar cansado como
fosse, mas desse momento não abria mão. E acordava muito cedo. O homem era
incansável. O homem tinha visões impossíveis, mas como não acreditava no
impossível, corria para realizar.
Sergipe muito deve a João Alves Filho, o filho do construtor
João Alves, de quem tinha muito orgulho e dizia que foi dele, do pai, que veio
o empreendorismo, “foi de meu pai que nasceu o mestre de obras”. Sim, um
verdadeiro mestre, não só de obras, mas da arte de governar e viver. Que líder
que perdemos.
Quando soube que dr. João tinha Alzheimer, fiquei
imensamente triste. Como podia aquele cérebro tão privilegiado, ficar doente?
João Alves perdeu o que tinha de mais forte, a mente. A partir daí, a vida já
não lhe era mais tão significativa, pensei. Confesso que fiquei revoltada com a
peça que o destino pregara a dr. João; e inconformada.
Hoje, a notícia da morte de dr. João, não me pegou de
surpresa. Todos já sabíamos, já esperávamos por isso. Pensei: “descansou, dr.
João, o senhor precisava mesmo descansar”.
Minha tristeza é imensa e profunda. Perdi um amigo, que conversava
olhando nos meus olhos, que me apoiava e prestigiava. Mas a tristeza de hoje, a
tristeza do fim, é menor que a tristeza que senti quando soube que ele já não
reconhecia as pessoas, que o cérebro já estava completamente comprometido pelas
névoas da doença. Foi difícil saber que
aquele homem excepcional tinha sido abatido naquilo que tinha de mais forte, de
mais brilhante: a mente. Chorei muito e comuniquei-me com Aninha Alves, por
quem sempre nutri muita ternura, o contato com ela de uma certa maneira me
ofereceu consolo. Dr. João era muito apegado a Aninha e se preocupava muito com
ela.
Estou muito triste hoje. Perdi um amigo. Perdi uma fonte de
inspiração. Meu coração está de luto. Sergipe está de luto. Perdeu seu maior
mestre de obras.
Texto reproduzido do Facebook/Clara Angelica Porto
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