terça-feira, 20 de julho de 2021

"O Barracão de Luiz Adelmo", por Amaral Cavalcante

Foto reproduzida do Google

Foto reproduzida Facebook/Nestor Amazonas e postada pelo blog

Texto publicado originalmente no Perfil do Facebook/Amaral Cavalcante, em 9 de junho de 2017

O Barracão de Luiz Adelmo
Por Amaral Cavalcante

Viajávamos num submarino amarelo, movidos pelo gás psicodélico da contracultura. Nosso destino eram os oceanos de paz e amor que banhavam o mundo. Na colorida década de sessenta, éramos Hippie, sim senhor.

Aqui em Aracaju, como no resto do mundo ocidental, a juventude tinha dois modos de resistir aos fundamentos de uma civilização que caducava: o engajamento no ativismo político partidário ou o choque de costumes, a reinvenção de posturas existenciais pregadas pelo movimento Beat.

De qualquer modo, era a juventude lutando pelos ideais de plena liberdade e de respeito aos direitos individuais, acima de tudo.

Reconfigurava-se a cabeça dos bem nascidos e bem instalados no topo da pirâmide social, uma galera rica de nascença contida no sufoco de uma Aracaju provincial, querendo igualar-se em curtição e consumo ao glamour do mundo lá fora. Mas precisávamos de algum lugar, aqui, que desse guarida às nossas inquietações.

Foi então que voltou Luiz Adelmo regressando de experiências cariocas onde aprendera as demandas do consumo cultural e suas possibilidades comerciais. Trazia histórias empolgantes: Intimidade com as estrelas, notícias de um mundo fantástico que existia pra lá do Vaza Barris, no Sul Maravilha do Teatro Opinião, nos bares de Ipanema e nas luzes estreboscópicas do Hippopótamus.

Adelmo sempre foi um visionário e voltou para cá na hora certa.

Abriu o primeiro bar multicultural de Aracaju, o “Barracão”, em imóvel alugado na Atalaia. Virou point obrigatório. Foi o Bar que nos acostumou a rumar para a praia, fosse como fosse: de carona ou dissimulado no transporte da Bonfim para encontrar consonância e abrigo psicodélico num bar que reunia tudo. Todo mundo ia!

E como era chique o bar de Luiz Adelmo! Primeiro, ele pintou grandes margaridas sob fundo azul no muro da calçada e decorou o ambiente com profusas flores de papel crepon. Tudo na linha despojada, como convém a um bar na beira da praia, mas já era uma ousadia estética na mesmice provinciana.  Depois, inventou noites temáticas como a do “Amor e paz”, devidamente decorada com o símbolo do movimento Hippe. Tratou de armar matinês políticas onde a turma dos “engajados” pudesse tramar a derrocada do poder, encorajados pela valentia etílica de vários engradados de cerveja. Logo depois, teve de consentir bailes de máscara e outros rococós, para contentamento da freguesia gastante. Tudo bem! E se não fosse ali, onde haveríamos de estar? A pista que trazia Aracaju à Atalaia nunca estivera tão congestionada!

Mas a missão de Luiz Adelmo não era tão fácil! Toda vez que ele promovia uma festa ela acabava em briga de murro. Rapazes brigões se afirmavam assim, no esfrega-esfrega da luta corporal. Mesas de pernas pro ar, contas sem dono, prejuízo irrecuperável e intimações policiais resultavam sempre. Chegou o dia em que não deu mais pra segurar e Luiz Adelmo foi tratar de vida melhor em outros ramos.

Voltou a inovar com a Galeria de Artes “Horácio Hora”, onde, por muito tempo, fez da incipiente arte plástica sergipana um empreendimento lucrativo. Graças a Luiz Adelmo começamos a entender a função essencial do marchand e a instituir por aqui um mercado de artes plásticas.

O seu memorável bar, o Barracão, foi o precursor da Atalaia que temos hoje: um lugar onde curtimos os refrigérios da cidadania e demos vazão à nossa recém descoberta rebeldia.

Texto reproduzido do Facebook/Amaral Cavalcante

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