sábado, 9 de junho de 2018

Um sujeito proparoxítono





Publicado originalmente no Facebook/Lucio Prado Dias  

Um sujeito proparoxítono

Por Lucio Prado Dias

“O futuro da humanidade está nas mãos daqueles que são capazes de transmitir hoje às gerações do amanhã, razões de vida e de esperança.”

Hoje como ontem, o exemplo de vida do médico Cleovansóstenes Pereira de Aguiar se encaixaria perfeitamente no pensamento do saudoso Papa João Paulo II. E eu acrescentaria: e lições de humildade, generosidade e tolerância.

A homenagem que a Prefeitura de Aracaju lhe concedeu ao inaugurar o Centro de Zoonoses de Aracaju com o seu nome, refletiu à época o reconhecimento do povo de Aracaju aos inestimáveis serviços prestados pelo homem que dedicou a maior parte de sua vida aos problemas de saúde da nossa gente, como médico e educador, transmitindo ao longo de sua existência lições de decência, honradez, respeito, probidade, dignidade, trabalho, altruísmo e amizade. E novamente reafirmo: lições de humildade, generosidade e tolerância.

Especial para mim foi ter o privilégio de saudá-lo naquela oportunidade, em nome da classe médica sergipana, poder falar um pouco sobre o colega, o amigo, o professor e o confrade da Academia Sergipana de Medicina, o mais que proparoxítono, por que não estava somente no detalhe gramatical que o seu nome trazia, Cleovansóstenes, mas pela pluralidade de suas virtudes. Hoje, com o coração partido, falo em nome da Academia Sergipana de Medicina e da Academia Sergipana de Letras, missão confiada pelo nosso presidente José Anderson do Nascimento, e também pela Sociedade Brasileira de Médicos Escritores - SOBRAMES, entidade que presido no momento em Sergipe. Mas poderia falar somente por mim, em função do profundo respeito e elevada consideração que me tornaram um de seus inúmeros admiradores, como professor, depois colega, e por fim, confrade e fraternal amigo.

Descrever a trajetória desse eminente cidadão, a sua importância no contexto histórico sergipano, por uma pessoa tão modesta e limitada, no entanto, é tarefa no mínimo arriscada. Escrevo, porém, com o coração, o que por si só dispensa maiores exigências intelectuais. Falo também como aluno permanente, desde os tempos idos da Faculdade; falo como admirador e colega. “Se um homem fala ou age com o pensamento puro, a felicidade o acompanha como uma sombra que jamais o deixa”, dizia Buda, líder espiritual hindu.

Cleovansóstenes Pereira de Aguiar, sergipano de Alagoas, nasceu na Usina Utinga Leão, em Rio Largo, em 16 de agosto de 1926, como segundo filho de uma série de doze. Seus pais chamavam-se Rafael Pereira de Aguiar, farmacêutico e Laura Gomes de Aguiar, prendas do lar. Aos 13 anos foi estudar em Garanhuns, Pernambuco, no Colégio 15 de novembro, em regime de internato, onde recebeu rigorosa e primorosa educação, principalmente nos campos da moral, da ética e dos bons costumes. Fez o curso colegial em Maceió, no Liceu Alagoano. Nessa fase praticou muitos esportes, chegando a jogar futebol em clubes da capital alagoana. Se o futebol não ganhou um excelente craque, melhor foi para a Medicina que ganhou um novo e destacado baluarte.

Fez o curso superior em Recife, superando inúmeras adversidades por dificuldades financeiras. Não fosse o seu grande esforço pessoal e a enorme colaboração prestada por duas organizações, a Casa do Estudante de Pernambuco, onde fazia suas refeições e a Companhia de Escolas da Comunidade, dificilmente o nosso homenageado teria conseguido o diploma de médico, como especialista em Ginecologia e Obstetrícia, em 1953. Mas a saúde pública era o seu destino. Não somente tratar do indivíduo mas cuidar de toda uma coletividade.

Em 2 de janeiro de 1954, Cleovansóstenes aportou em Própria onde estagiou durante 23 dias no SESP, antes de ser designado em definitivo para Gararu, em 25 de janeiro. Iniciava-se a fase do Cleovansóstenes sergipano. Em Gararu conheceu Maria da Glória, que viria a ser a sua esposa em 1955. Em 1957 estabeleceu moradia em Riachuelo, onde teve uma intensa participação social e comunitária, realizando obras na forma de mutirões, como o ginásio, a construção de um novo hospital e maternidade, reformando as instalações da igreja, entre outras realizações. Fez muito por Riachuelo, mesmo sem mandato, onde permaneceu até 1969 quando então passou a residir em Aracaju, mas sem se desligar da querida cidade.

Em 1963, atendendo convite do inseparável amigo Alexandre Gomes de Menezes Neto, colega e confrade, que partiu para o infinito no ano que passou, ingressou na Faculdade de Medicina na disciplina de Parasitologia. Uma vez confidenciou-me: ser professor na nossa escola de Medicina, talvez tenha sido sua maior realização. O homem certo na hora certa.

E eu questiono agora, qual teria sido mesmo a sua maior realização? Ter sido o professor ainda hoje, mesmo aposentado, idolatrado pelos seus alunos? Ou ter sido Prefeito de Aracaju, cumprindo o mandato com dignidade, lisura e probidade, com inúmeras realizações entre as quais a ampliação da Av. Hermes Fontes, tornando possível a expansão da zona sul da cidade. Difícil agora querer enumerar as suas realizações como Prefeito de Aracaju. Livre de amarras ideológicas, exerceu o cargo sem vinculação sem a sombra da política partidária.

Alguns vão querer dizer que a maior realização do nosso querido confrade foi a intensa obra médico-social que desempenhou, como médico sanitarista, cuidando da saúde coletiva do nosso povo. Mas muitos vão replicar, dizendo que a sua maior realização foi construir uma plêiade de admiradores, de amigos feitos ao longo da caminhada, pela sinceridade de seus propósitos, pela lealdade de suas colocações, pela sinceridade de suas palavras ou pela grandiosidade de seus atos. Outros, não satisfeitos, vão querer lembrar o ser cristão, o homem de fé inabalável, humanitário, humilde e modesto na sua generosidade.

E todos terão razão. Porque esse é o proparoxítono Cleovansóstenes Pereira de Aguiar. Na Academia Sergipana de Medicina, um dos seus mais entusiastas participantes. Quando o confrade Gileno da Silveira Lima desfraldou a bandeira de criação da Academia, esteve presente com toda a garra e perseverança e por isso coube-lhe, por indicação de seus pares, a indicação para ser seu primeiro presidente, de 1994 a 1996. E mais uma vez cumpriu a contento a sua tarefa.

Finalizando, recordo uma entrevista sua no Jornal da Sociedade Médica de Sergipe quando o repórter lhe fez a seguinte pergunta: que tipo de lição o senhor aprendeu no decorrer da vida? E a resposta: “Primeiro que somos filhos de Deus e que Deus é amor. Segundo, é que o homem não nasce feito, porém se faz pelo seu proceder, pelo seu caráter e por sua vivência. Vivendo no meio dos outros homens com retidão e probidade. Terceiro, é que não devemos nos considerar inferiores a ninguém, nem tampouco superiores e marchar com a cabeça erguida, seja para onde for”.

Este é o imortal Cleovansóstenes Pereira de Aguiar. Que Deus, na sua infinita bondade, proteja a sua alma por toda a eternidade. Descanse em paz, grande guerreiro, na tranquilidade de sua grandeza. Ficaremos nós aqui na planície mais pobres, tristes, desolados e consternados com a sua partida.

Aracaju, 07 de junho de 2018

Texto e imagens reproduzidos do Facebook/Lucio Prado Dias.

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