quinta-feira, 10 de agosto de 2017

Mestres da Medicina em Sergipe - José Teles de Mendonça


Publicado originalmente no Facebook/Antonio Samarone, em 09/08/2017.

Mestres da Medicina em Sergipe. 
Por Antonio Samarone de Santana.

José Teles de Mendonça (Zeca), um doutor de verdade – nasceu no Sítio Aracati, no 18 do Forte, Aracaju, em 02/06/1950; filho do seu Tonico e dona Hermínia; e neto do lendário Major João Teles, comunista dos tempos de Luiz Carlos Prestes. O dr. Teles fez o primário com a professora dona Sinhá; e o temível exame de admissão no Colégio Atheneu, de passado glorioso. Durante o curso ginasial, puxou diariamente a pé do 18 do Forte ao Colégio sem reclamar. Menino pobre, o pai injustamente expulso do Exército acusado de comunista, sem nunca ter sido; pagando pelo Major, o sogro. O dr. Teles meteu a cara nos livros com a pretensão de ser mecânico; o que o seu pai consertava, engenheiro mecânico. A escola pública era o caminho para a cidadania. As dificuldades financeiras eram de tal ordem, que durante os sete anos que estudou no Atheneu, Teles foi duas ou três vezes na cantina. Menino do subúrbio, lateral direito de destaque nos times de peladas, Zeca incorporou uma disciplina quase militar e estudava com disposição.

Um fato expressa bem a personalidade que estava em formação: Teles gostava de frequentar o Batistão, torcer pelo Confiança; e como não tinha dinheiro para o ingresso conseguia entrar fortuitamente por um canto que tinha um manguezal. Num grande jogo a maré estava cheia, pelo manguezal não dava, resolveu pular o muro, ali do lado dos antigos prédios da UFS. Subiu primeiro num telhado de casa, alcançou o muro, e num ato de coragem, pulou incontinente para dentro do estádio. Por azar, o segurança estava escondido atrás da coluna, e não teve compaixão e ordenou, pule de volta. Como, indagou o menino assustado, o muro tinha quase quatro metros de altura. Não quero saber, pule de volta, insistia a autoridade... Não havia jeito, quatro metros. O segurança pegou o menino de treze anos pelo braço, subiu os degraus da arquibancada e desfilou com o jovem infrator para exibi-lo como um troféu aos presentes. Nesse momento o grande desespero de Teles era que o Pai estivesse no campo e assistisse aquela cena de humilhação. A vergonha foi tanta, que a partir desse dia, até hoje, aos 67 anos, Teles nunca mais pisou os pés num campo de futebol.

O menino que queria ser mecânico, foi aprovado no vestibular de medicina em 1969, sem ter passado por nenhum cursinho e antes das cotas. Foi monitor de anatomia e de cirurgia, e a partir do segundo ano de medicina passou a morar no Hospital de Cirurgia. Morar mesmo, arrumou um quarto desocupado no antigo Hospital Infantil e se mudou, de mala e cuia. Dormia e acordava dentro do hospital. Quando chegava um cadáver para a anatomia, no outro dia já amanhecia dissecado, Teles passava a noite bisbilhotando o morto. Não perdeu tempo, entrou na equipe de Cirurgia de Bragança (o velho), Djenal e Felizola; o que tinha de melhor na antiga cirurgia, onde se fazia de tudo. No quarto ano Teles já operava sozinho. Durante o curso de medicina foi professor de física no Atheneu, de onde tirava a sobrevivência. No tempo que sobrava, metia-se nos plantões do Pronto Socorro. Só fazia estudar. Ao final do curso, em 1974, resolveu que deveria sair de Sergipe para especializar-se em cirurgia torácica. Durante a residência médica de dois anos no Rio de Janeiro, as circunstâncias levaram-no para a cirurgia cardíaca.

De volta a Sergipe, em 1977, foi dirigir a primeira UTI de Sergipe, criada pelo Dr. José Augusto Barreto no Hospital de Cirurgia, em 1972. Em paralelo, o Dr, Teles iniciou a organização do primeiro serviço de cirurgia cardio torácica em Sergipe. Em parceria com novos cirurgiões, Valdinaldo e Calumby, montou uma equipe de estudantes (Marcos Ramos, Marcos Lemos, Geodete Batista, Luíza Dórea, Edson Franco e Rika Kakuda), essa foi a primeira “liga” organizada em Sergipe. Dessa equipe também participou o atual Prefeito de Aracaju, Edvaldo Nogueira, que segundo o Dr. Teles, “o Prefeito era um aluno interessado, inteligente, habilidoso e possuía um talento evidente para a cirurgia”. Em julho de 1978, o Dr. Teles realizou a primeira cirurgia cardíaca em Sergipe, com circulação extracorpórea, na paciente Ermita Gonzaga. Onze anos antes tinha ocorrido uma cirurgia cardíaca no mesmo Hospital de Cirurgia, realizada por um médico visitante. Em julho de 1986, a equipe do Dr. Teles realizou o primeiro transplante cardíaco em Sergipe. O primeiro serviço de cirurgia cardíaca foi um sucesso, e funciona atualmente no Hospital do Coração e já realizam mais de dez mil cirurgias.

Em 1977, o Dr. Teles tornou-se professor de cirurgia da Faculdade de Medicina da UFS. Hoje é um profissional reconhecido mundialmente, trabalhos publicados em importantes revistas científicas, criador de técnicas cirúrgicas que levam o seu nome, pesquisador reconhecido, postura ética humanista, e muita simplicidade. Dr. Teles é casado com Lícia Resende, odontóloga, pai de dois filhos, Vivian e Victor, e avô de quatro netos. Ao final, perguntamos ao Dr. Teles o que seria um bom médico, e ele resumiu: “o bom médico é que sempre escuta o paciente, algumas vezes com os ouvidos, outras vezes com os olhos, e sempre com o coração.”

(Antonio Samarone de Santana - blogdesamarone.blogspot.com.br)

Texto e imagem reproduzidos do Facebook/Antonio Samarone.

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